Piorou o cinema, ou piorou o público?
28/02/12 07:35
O post de ontem sobre a infantilização do cinema rendeu tantos comentários interessantes, que peço licença para continuar no assunto.
Peguei um livro aqui na estante, “Box-Office Hits”, que lista, ano a ano, os campeões de bilheteria do cinema americano de 1939 a 1988 (o livro é de 1989).
Claro que é difícil comparar o gosto do público em diferentes períodos históricos, mas é assustador lembrar que, em 1969, o terceiro maior público do cinema americano foi “Perdidos na Noite” (“Midnight Cowboy”), de John Schlesinger.
Quem já viu o filme sabe que é uma história sórdida sobre dois vagabundos que tentam se dar bem nas ruas violentas de Nova York. Jon Voight faz um caipira que ganha a vida transando com senhoras por dinheiro. Dustin Hoffman faz um junkie. É uma obra-prima.
Pois bem: “Perdidos na Noite” não só bateu “Hello, Dolly!” na bilheteria, como ganhou o Oscar de melhor filme (só para efeito de comparação, a terceira maior bilheteria de 2011 foi “A Saga Crepúsculo: Amanhecer”).
O que aconteceria com “Perdidos na Noite” se fosse lançado hoje?
Possivelmente sairia direto em DVD, ou seria exibido em quatro salas alternativas em Nova York e São Francisco.
Outros exemplos curiosos:
Em 1967, “A Primeira Noite de um Homem” foi a maior bilheteria do ano. “Bonnie and Clyde” foi a quarta.
“2001”, de Stanley Kubrick, foi a segunda bilheteria de 1968, atrás de “Funny Girl”.
“M.A.S.H.”, a visão ácida de Robert Altman sobre o Vietnã, foi a terceira maior bilheteria de 1970, mesma posição de “Operação França” no ano seguinte.
E não vou nem falar de “O Poderoso Chefão” (1972) e “O Exorcista” (1973), que lideraram as bilheterias em seus respectivos anos.
Isso quer dizer que todos os filmes lançados naquela época eram obras-primas voltadas ao público adulto?
Claro que não. As décadas de 1960 e 70 também foram cheias de diversão escapista para adolescentes, desenhos animados e romances melosos.
“Mogli – O Menino Lobo” foi a segunda bilheteria de 1967; “Romeu e Julieta”, a cafonice suprema de Franco Zeffirelli, foi a quinta maior bilheteria de 1968, e “Se Meu Fusca Falasse” ficou em segundo lugar em 1969.
Ou seja: tinha para todo mundo.
Bem diferente de hoje, quando os cinemas são completamente dominados por continuações, desenhos animados e megaproduções inspiradas em gibis.
Fica a pergunta: o que aconteceu com o tipo de público que lotava os cinemas para ver “Perdidos na Noite”? Morreram, todos? E os filhos e netos desses, onde estão? Vendo “Transformers”?
Amei o texto, Barça, mas, sejamos justo: ambos mudaram – e, infelizmente, não para melhor.
O que vemos é só uma batalha, onde um lado tenta responsabilizar o outro pela queda da qualidade mas, na boa, o que rola, nesse caso, é o efeito tostines: público ruim gera filmes ruins; filmes ruins geram público ruim. Azar de quem quer fugir dessa roda de hamster do inferno…
Uma tentativa de entender é pensar no que eram os cinemas naquela época. Aqui em SP a gente ía ao Belas Artes, ao Cine Bijoux, ao Arouche, ao Cinesesc, Gazetinha e similares pra ver filmes bons. Ao centrão pra ver as delciosas e inesquecíveis pornochanchadas. Alguns desses cinemas sumiram e pode-se dizer que esse formato de sala está na mesma situação do mico leão dourado. No lugar chegaram os imax da vida (sensacionais por sinal – como qualidade) e os cinemarks. Mas ninguém vai colocar um filme menor (em produção) num imax. É cinema pra Hugo Cabret, pra Senhor do Anéis, para Harry Potter, Cavalo de Guerra, Avatar, etc.
No mais, a proliferação de cinemas para mauricinhos é um veneno, estilo Shopping Higienópolis, Morumbi, Iguatemi. Pessoas que estão mais preocupadas com o celular que vão teclar durante a projeção do que com o filme que vão assistir. É o tipo de gente que diz que foi ao filme da Megan Fox (como se ela fosse diretora de algum filme). O público piorou sem dúvida. Cinema deixou de ser programa cultural para ser social. Os cinemarks são uma indústria de pipoca e coca-cola sem gás, jamais um centro para ver bons filmes. Em SP restam apenas os unibancos da rua Augusta e Frei Caneca, além do Reserva Cultural e Cinesesc. Acho também que o apelo do 3D e dos games junto ao público jovem está jogando a qualidade pelo ralo, já que pra eles o bom é o que vem camuflado de muita tecnologia. André, veja o seu próprio caso. Você gosta de ler James Ellroy, gosta de filmes que caminham na lâmina da navalha, de filmes de gângster como Sexy Beast, etc. Aí só tem tomate muito selecionado. Mas esse seu gosto não é o “popular” e reflete esse descontentamento e o questionamento sobre “pioraram os filmes ou piorou o público?” Piorou o público, porque esses filmes legais continuam a existir. Eu vejo uma pérola como “In Bruges” e quase ninguém que conheço viu (estupidamente traduzido aqui como Na Mira do Chefe). E se recomendo, não gostam. Hoje vários filminhos tontos como Medianeras fazem sucesso no público metido a intelectual refinado. Filminhos tontos como Meia Noite em Paris. Bobinhos como Árvore da Vida. O que é mais estranho é que tudo, absolutamente quase tudo está disponível para ser comprado, mas o público insiste em Spielberg ainda. Na minha modesta opinião, os shopping centers de mauricinhos e patricinhas e pipoquinhas de 10 reais estão ditando o gosto cinematográfico. E, claro, o interesse financeiro dos estúdios. Se você fosse dono de um estúdio e tivesse grana para uma única investida, você produziria Rocky ou Sexy Beast? Sim, eu acredito que você produziria Sexy Beast. Eu também! Por isso não estamos milionários.
A medida que nos afastamos de grandes cidades como rio e são paulo o cenário é ainda mais triste. Minha cidade tem umas 14 salas de cinema, consigo visitá-las no máximo duas vezes ao ano por completa falta de filmes com um mínimo de qualidade.
Tem que torcer para filmes como Midnight in Paris (o que não é pedir nada demais) chegarem com semanas e semanas de atraso.
O que nos salva é um sesc da vida que faz umas exibições de filmes cult de vez em quando… mas novidades na tela grande… nunca
Aí você também tem que enfrentar os filmes dublados, Thiago…?
Ótimo comentário Barcinski. Eu também gosto destes filmes que você citou. Detesto estes filmes idiotas como esse tal de Crepúsculo. Mas tenho que confessar um “pecado” (rsss)… também gosto de “Guerra nas Estrelas”. Mas claro que 2001, A Primeira Noite de um Homem, Midnight Cowboy, etc. são filmes de outro nível.
Eu, pessoalmente, acho Guerra nas Estrelas um porre, mas é um filme de aventura muito bem feito, merece o sucesso que fez. Se todos os filmes comerciais de hoje fossem iguais a ele, estaríamos bem melhor.
Em entrevista recente ao Estadão (26/02) Morrissey afirmou que pela programação atual da televisão dos Estados Unidos você deduz que todos americanos têm 5 anos de idade.
Aqui é e mesma coisa.
É isso aí André, vendo Transformers, navegando na internet ou jogando videogame. Se no passado o cinema era uma forma de arte, de cultura e entreterimento, hoje é apenas esse último. O cinema, a música e a literatura, não tem mais a relevância que tinha anteriormente. Esta geração não vê o cinema com o mesmos olhos que nós viamos e vemos. Tempos Modernos.
Acho que é bem por aí, Adalberto. E acho que é simplório simplesmente achar que o problema está somente no público. Questionou-se tanto os valores, foram produzidos tantos produtos, que a arte e cultura banalizaram-se. Artistas e intelectuais “cults” não perceberam que era a existência de referências razoavelmente sólidas que permitiam a profundidade de suas obras (ainda que fosse para questionar estas referências). Houve, claramente, com a indiferência axiológica, uma dessacralização da arte e da cultura…
Olá, Barcinski. Rapaz, tudo mudou demais dos anos 70 pra cá. Sou casado, pai de dois filhos, mas relativamente novo (38), de modo que tenho claro na memória os tempos em que eu era o “filho”. Moro em Brasília. Se meu pai quisesse ir ao cinema nos anos 70 e 80, as opções se limitavam a três ou quatro salas. Se ele quisesse assistir um filme na TV, tinha que esperar sábado à noite, para ver o “Supercine”. Durante a semana, as notícias “tinham hora”: o Jornal Nacional. E, hoje, quando eu sou o pai? Há centenas de salas (comerciais e “cults”), dezenas de filmes na televisão (a cabo) e as notícias são imediatas, o dia inteiro. O que eu quero dizer é que a chance de haver uma “novidade impactante” nos dias de hoje é muito mais remota. O Laerte anda vestido de mulher e não causa o menor espanto (a não ser quando entra no banheiro…). E mais: vivemos a era da mais absoluta indiferença axiológica, em virtude do incessante processo econômico (que nos rouba o tempo), das irrefletidas e românticas “desconstruções culturais” e da descrença na política (sistemas liberais corruptos e sistemas igualitários ditatoriais e igualmente corruptos). A verdade é que neguinho não tá conseguindo se achar no mundo (já é uma vitória se manter), de modo que é exigir demais dele que ele vá perder o pouco tempo disponível para tentar entender o que um filme exigente quer significar. Não há novidade e não há referências. Como criar algo interessante num ambiente assim? Esse é o desafio dos bem-pensantes da arte… E, a meu ver, eles não estão nem perto de conseguir (afinal, ainda acham “revolucionário” desconstruir…).
Cláudio, para mim é neste comentário que você aborda um ponto crucial: o da indiferença axiomática. Causas à parte, de fato parece haver uma perda de interesse no juízo de valor. Digo até mais, sinto que existe uma rejeição até certo ponto reacionária ao juízo de valor. Como se julgar os méritos de uma obra de arte (ou de entretenimento, não vejo uma separação aqui) fosse algo reprovável. Concordo ainda que de fato perderam-se as referências (ou estas se modificaram). Também não posso em sã consciência defender que a opção pela diversão sem maior profundidade ou significado não seja legítima; é claro que é. Só não me furto a “tomar partido” e dizer que, na minha visão, o indivíduo perde (e muito) a não fazer o movimento em busca de profundidade em sua apreciação das coisas (e, antes disso, das referências que tornam possível esse movimento). Uma coisa é não enxergar o valor em “Taxi Driver” (para continuar nesse exemplo). Outra coisa é rejeitar a referência sem ter tentado de fato (o que às vezes percebo como atitude prevalente). Também penso que as referências do passado podem não ter mais o impacto da novidade, e ainda assim preservar o seu valor estético (sem mencionar o histórico). Contexto é tudo. Para finalizar, concordo quando você diz que os produtores/criadores estão diante de um desafio, o de estimular o público para conteúdo relevante e ao mesmo tempo adequado ao contexto atual. Só não enxergo que o “problema” (por falta de melhor termo) esteja unilateralmente no lado dos “bem-pensantes da arte”. O público indiferente ao valor estético possivelmente continuaria indiferente, sem predisposição a fazer o esforço para alcançar mais profundidade e significado (entendo que sempre haverá algum nível de esforço para isso, mesmo em produtos supostamente mais alinhados aos tempos).
Putz, “axiomática”. “Axiológica”, é claro. Isso é o que dá interromper um texto sobre lógica e banco de dados para comentar sobre arte em blog, sem revisar o que escreve. Foi mal. =)
Vamos lembrar de outra categoria infantilizada. A dos críticos musicais. Olha o Lucio Ribeiro aê geeeeeeente… “A volta do Radiohead: e o rabinho de cavalo do Thom Yorke”
Acabei de ler no Estadão algo parecido: Morrissey parece um segurança de boate e tem voz de mulher… “pakabá”
Perdidos da Noite é um clássico que o meu tio me apresentou junto com Monty Python, que é o tipo de comédio que seria impensável nos dias de hoje, onde tudo é tão politicamento correto.
O negócio é como vc disse Barça, esperar sair em DVD ( se sair por aqui né) ou encomendar uma cópia.
Abrs.
seu tio te apresentou para “aquele filme que foi o primeiro a mostrar um boquete gay ?” Pô , graaaande contribuição cultural..” dele .
kkkkkkkkkkkkk
Pô Manolão, tente ter opinião própria ao invés de copiar o que o outro escreveu abaixo. Parabéns meu caro!!!
André, você esqueceu de citar que alem de continuações, desenhos animados e megaproduções inspiradas em gibis, temos também todos os tipos de remakes, é a falta de imaginação completa. Daqui a pouco vão extinguir a categoria de melhor roteiro original do oscar, porque não vai existir mais nenhum.
André, Excelente ! E apenas para registrar : a mudança do lay-out no espaço dos comentários ficou ótima. Agora sabemos quem está respondendo o comentário de quem. Obrigada !
Olha, eu gosto de desenho animado e gibi. Cresci com isso. Esses filmes existem desde faz muito tempo também. O fato de fazerem tanto sucesso hoje, na minha opinião, é que finalmente a tecnologia do cinema é capaz de dar vida àquilo que antes somente era possível no traço: vôos, explosões gigantescas, seres esquisitos, verdes, com garras, etc etc etc. Compare o Hulk de hoje com o dos anos 60 ou 70, não sei bem. Ou o Batman. O que acontece, eu acho, é que eles ficaram visualmente muito atrativos. Se você for pensar apenas pelo lado visual e da fantasia, vai ver que eles suprem hoje o que antes só podia ser imaginado. Claro que viver em uma sociedade que prima por rapidez em tudo, da comida ao prazer, contribui bastante também. Um abraço!
Concordo com isso. Para o público de Quadrinhos, as adaptações nunca foram tão boas como as atuais. Nem tudo piorou, hehe.
Pois é, a geração que cresceu assistindo Spielberg são os adultos de hoje. Não só isso, quadrinhos, George (Star Wars) Lucas, mangá…
Com essas adaptações, os estúdios conseguem tirar dinheiro dos adolescentes e dos jovens adultos (young adults).
Também cresci consumindo essas coisas, e por isso acabo assistindo essas porcarias por pura curiosidade. Mas só um filme com uma história descente me satisfaz.
Cresci comendo McDonald’s. De vez em quando acabo comendo esse lixo. Mas só comida de verdade me satisfaz hoje em dia.
Perdidos da Noite , aquele filme que foi o primeiro a mostrar um boquete gay ? Pô , graaaande contribuição cultural..
Shakespeare , por outro lado , é uma merda datada..
Tá bom, Ricardo.
rsrsrsrsrsrs isso aqui é muito engraçado. ótimo para quem trabalha em uma repartição sacal.
Taí outra coisa que vem se definhando nas últimas décadas: a capacidade das pessoas de “boa educação e nível intelectual” intepretarem um texto. Na verdade, está tudo interligado.
É o que eu comentava ontem sobre a “ditadura da mediocridade”. O sujeito faz um comentário constrangedor (para si próprio) na internet e acha que está arrasando. “Vejam, sou ignorante e preconceituoso. Estou na crista da onda, antenado com os tempos!”
Infelizmente hoje as salas de cinema em sua grande maioria só abrem espaços para esses filmes blockbusters, quem quiser assistir um filme mais elaborado e menos comercial tem que “caçar” uma sala para poder ver. Aqui em São Paulo por exemplo, até que temos algumas boas opções mas imagino que deva ser muito difícil fugir do “cinemão” em outras cidades. Uma pena.
Na minha cidade (Minas Gerais) não tem mais cinemas fora de Shopping…e esse geração que frequenta shopping não me dá vontade nenhuma de sair de casa…acho que está tudo muito comercial, ganhar, ganhar e ganhar, oferecer só o que tem retorno fácil e rápido…e deixei de frequentar as salas por não compartilhar da ideia de que cinema é para “desligar a mente”…
e qual seria o motivo de chegar no cinema com fome?
no filme o espião que sabia demais, das vinte pessoas que entraram na sala apenas umas sete ficaram até o final do filme. algumas saíram com apenas 25 minutos. sala de cinema em shopping center, diga-se de passagem.
Oba!..Daí um filme bom pra se ver no cinema, sem aquelas pessoas pentelhas com celular chutando poltrona e tagarelando.
bom e no meu caso engraçado. no final do filme uma das sete pessoas presentes gritou: “e quem entendeu o filme levanta o dedo”
Impressionante o Dustin Hoffman, ator de vários bons filmes nos anos 70 e 80, não tem como esquecer de Papillon, a 1ª noite de um Homen, Perdidos na noite, Straw Dog, Maratona da morte a lista é enorme…Vejo hoje ele fazendo entrando numa fria e Kung fu Panda (voz) acho que até ele se infantilizou.
dennis hopper já respondeu que realizava coisas como super marios bros para poder comprar sapatos para o filho rsrs
Jesuis…
Por isso que ele se mandou pra TV pra fazer a série do Michael Mann.
O cinema trocou de lugar com a televisão. É na telinha que estão os melhores roteiristas e histórias hoje em dia.
Concordo…Problema na TV é os intervalos comerciais meio que desanima de assistir.
Incidentalmente, a HBO, que transmite a série do Michael Mann estrelada pelo Dustin Hoffman, não tem intervalos comerciais durante os programas.
Sim: vendo transformers. Acredito que a emancipação feminina tenha sido um dos gatilhos das profundas mudanças que pulverizaram esse público que lotava os cinemas para ver Perdidos na Noite… Casais com vida profissional ativa, novas formas de educação e atividades, evolução tecnológica, enfim. Lamentavelmente o passado – e suas qualidades – ficou mesmo para trás.
muito bom o tema dos dois últimos posts.
achei o livro citado da geração hollywood 70 por apenas R$9,90 na livraria do pátio savassi em BH. fica a dica.
sugestão: barcinski, manda uma lista de algumas cenas clássicas do cinema acompanhadas de uma música ( não falo de trilha composta para o filme),que mais te marcaram na história. eu já vou logo pensando em cavalgada das valkirias em apocalipse now e surfin bird do trashman em nascido para matar e claro, easy rider…
“Romeu e Julieta”, a cafonice suprema de Franco Zeffirelli, foi a quinta maior bilheteria de 1968, ”
Cara , volta pros teus rockinhos.. Vc como “crítico de cinema ” é uma tragédia ..
Vindo de alguém que acha Shakespeare “uma merda”, é um tremendo elogio.
Yes! Barcinski rules!
André, como eu comentei ontem, meus pais frequentaram assiduamente cinema dos anos 50 aos 70 (infelizmente em 72 minha mãe se foi), e aos 6 anos eu já estava enfiado em cinema com minha mãe… Meu pai foi comerciante, minha mãe era dona de casa, não eram intelectuais, e claro, viveram em uma época em que a TV ainda não anestesiava multidões… Mas eu me lembro das conversas deles sobre os filmes, alguns não podiamos assistir, devido a faixa etária e coisa e tal, mas ficavamos aguados escutando a conversa, simples, de pessoas que curtiram tal filme, me lembro especialmente qdo foram ver “Psicose”, foi um furor (até hoje qdo assisto me lembro da empolgação deles com o filme), e Hitchcock sempre foi favorito em casa…Até hoje meu pai curte muito cinema, mas tem um gde sentimento de estranheza com a linguagem game, violencia e ausencia de boas estórias, acaba vendo muito cinema em casa, sua coleção de DVDs classicos, e outro dia fez um comentario muuuito interessante sobre os personagens de Katherine Hepburn em “Lagrimas do Céu” e Meryl Streep em “Duvida”… Teve uma educação comum na sua época, mas com referencias que talvez tenham construido um repertório sólido…Ha muito tempo ouvi do Mauro Rasi (que saudade… meu conterraneo) a mesma coisa sobre seus pais, mas em relação ao teatro, essa questão do repertório cultural da classe média de há 50 anos atras…Algo muito grave aconteceu, uma decadencia absoluta dos processos educacionais, mas tb dentro de casa, a perda entre gerações se tornou um processo vicioso de empobrecimento cultural (vai conversar hoje com um comerciante de papel, profissão do meu pai, sobre cinema…!) So para completar (isso ta ficando enorme), antes da cerimonia eu assisti em casa a “Bigger than life” do Nicholas Ray, de 1956, e meu Deus!!! Vai ficando dificil, muuuito dificil… Thatcher????
Concordo com vc, é chocante ver a queda do nível no entretenimento familiar. Meus pais também gostavam muito de cinema, mas não eram especialistas, e viram grandes filmes. É muito triste perceber que a média, hoje, é muito ruim.
Fala, Barcinski. Li o post de ontem e o de hoje e estava pensando se esse termo “infantilização” não é um tanto errado. Acho que “estupidificação” (acho que nem existe essa palavra) ou “emburrecimento” seriam as corretas. É como se o que fosse infantil fosse estúpido, e sabemos que não é por aí. Tenho a impressão de que o cinema piora à medida que o gosto do público fica pior, ou, em outras palavras, o público fica menos exigente e mais acomodado. Veja só, Transformers 1 faturou mais de 700 milhões de dólares, Trans 2 mais de 830 milhões, e o terceiro, que é o pior deles (se tal coisa é possível), passou de 1 bilhão. Se esses caras que fazem essas porcarias conseguem ganhar dinheiro assim, tão fácil, pra que eles vão se esforçar em fazer filmes melhores? Olha a catástrofe que foram aqueles Star Wars novos e a fortuna que eles fizeram. O mundo me parece cada vez mais burro e nessa medida nossa cultura (de massa) está ficando mais idiota. Uma vez ouvi Rubens Ewald Filho dizendo que cada tempo, em relação ao cinema, tem o que merece (ele se referia aos primeiros e lamnetáveis filmes do Jim Carrey). Li sua crítica de Ace Ventura na SET aquela época, e Rubens não em parece ter errado nisso. Não vivi os anos de O Poderoso Chefão, Perdidos na Noite e outros, mas o público, em geral, me parece cada vez mais burro sim, não infantilizado.
Ciclos. Os tempos mudam. As gerações mudam. Os valores mudam. O cinema muda. E tem gosto pra tudo. Cada vez mais o nosso tempo deve ser preenchido com diversão e distração, nada que nos leve à instrospecção ou a pensar e raciocinar. O ciclo agora está na fase dos filmes babacas, cheios de efeitos especiais mega power super, mas uma hora o publico tambem vai se cansar disso, e os filmes bacanas voltarão às telas. Assim espero…
Eu acho que essa infantilização do público, além de influenciar os filmes mais comerciais, de certa forma também o faz com os de temática mais adulta. Destes filmes “adultos” lançados nos últimos 4 ou 5 anos e que concorreram ao Oscar, o único que realmente chamou a minha atenção foi o Cisne Negro. A impressão que eu tenho é que mesmo os filmes de temática mais adulta têm de ser lançados em um formato mais mastigado que os da década de 70 e antes.
Só uma pequena correção: M.A.S.H. a história é durante a guerra da Coréia e não no Vietnã. Na época do filme a guerra no Vietnã ainda estava explodindo por lá..rsrs
Sim, mas o alvo do filme era justamente a Guerra do Vietnã.
Isso aí vale um post. O filme é adaptado de um livro sobre a Guerra da Coréia, mas o Altman queria que o filme não deixasse claro de que guerra se tratava, obviamente para desviar o foco pro Vietnã. Foi o estúdio que o obrigou a colocar uns créditos no início. Mas o Altman até colocou uns extras com uns chapéus tipicamente vietnamitas. Lembrando que o Altman não foi a primeira escolha do estúdio, e irritou tanto os atores que esses chegaram a pedir aos produtores que o demitissem. Dá uma olhada nesse link, tem um texto legal sobre a história: http://oldschoolreviews.com/rev_70/mash.htm
Interessante…Não sabia dos detalhes nos bastidores. Valeu pelas informações!
abs
Procurem no Youtube o Kevin Smith falando sobre quando ele foi contratado pra roteirizar um filme do Superman. É hilário e sintomático da insanidade que tomou conta dos produtores burocratas de de Hollywood.
Acho que, com a invasão dos cinemas pelos adolecentes, esse ambiente ficou menos atraente para os adultos. Quem aguenta dividir espaço com seres barulhentos, sem noção, mais interessados em se afirmar que assistir ao filme?
Muito mais cômodo, pegar um filme na locadora (ou baixar na internet). Ou então ir à cinemas voltadas ao público mais adulto (em SP, o Espaço Unibanco, a Reserva Cultura, o Cine Cultura, estão sempre cheios). Eu, pelo menos, há anos que não vou a um Cinemark da vida.
Os estúdios perceberam que é mais díficil tirar dinheiro dos adultos, passaram a investir menos. Mas filmes adultos pós-Spielberg existem. Renderia até uma listinha, hein.
Interessante e concordo tb.
Não só o cinema. As telenovelas, nos 70, eram muito mais ousadas (falo mais das do horário das 22h, que existiu até 1983) e as interpretações, naturalistas. Hoje o que vc vê são atores atuando como num teatrinho infantil, sublinhando gestos e caretas, pq senão o público, imbecil, não entende o que está sendo dito. Tá tudo nivelado por baixo.
bem observado!
Refletindo um pouco sobre o assunto, acho que deixei de frequentar cinema com medo , ou de saco cheio mesmo, de encontrar filmes de “entretenimento”, creio que tudo de certa forma é reflexo da sociedade de mercado, onde só olhamos praticamente para o consumo e o descarte logo em seguida, e assim também seremos consumidos e descartados, não somos mais pessoas, não teremos mais cérebros, não pensaremos mais, fica mais fácil vcs não acham.
Olá, realmente interessante as considerações dos posts de hoje e ontem. Acho que uma explicação plausível pode residir na chamada “democratização” dos cinemas. Quando eu era criança, na década de 80, Curitiba tinha umas 5 ou 6 salas de cinema no centro da cidade. Isso, por si só, acabava atraindo uma pequena parcela da população para o cinema. O mesmo valia para o público, que era mais adulto. Eu, quando criança, ia no cinema só nas férias, a tarde, assistir trapalhões ou algo do gênero.
A diferença de hoje parece-me ser que as salas de cinema se multiplicaram, tornando essa diversão acessível não só ao público adulto e mais culto, mas também ao público infanto-juvenil que frequenta os shopping centers. O mesmo vale para o nível cultural do público, já que o cinema hoje alcança os leitores de best-sellers e auto-ajuda (vide o sucesso de filmes sobre espiritismo e os filmes-novela da globo). Essa popularização acabou afogando os filmesm mais adultos, já que o dono do cinema não vai deixar de ter mais uma sala de transformer dublado lotada para passar um filme mais adulto que não vai atrair tanto público.