Piorou o cinema, ou piorou o público?
28/02/12 07:35
O post de ontem sobre a infantilização do cinema rendeu tantos comentários interessantes, que peço licença para continuar no assunto.
Peguei um livro aqui na estante, “Box-Office Hits”, que lista, ano a ano, os campeões de bilheteria do cinema americano de 1939 a 1988 (o livro é de 1989).
Claro que é difícil comparar o gosto do público em diferentes períodos históricos, mas é assustador lembrar que, em 1969, o terceiro maior público do cinema americano foi “Perdidos na Noite” (“Midnight Cowboy”), de John Schlesinger.
Quem já viu o filme sabe que é uma história sórdida sobre dois vagabundos que tentam se dar bem nas ruas violentas de Nova York. Jon Voight faz um caipira que ganha a vida transando com senhoras por dinheiro. Dustin Hoffman faz um junkie. É uma obra-prima.
Pois bem: “Perdidos na Noite” não só bateu “Hello, Dolly!” na bilheteria, como ganhou o Oscar de melhor filme (só para efeito de comparação, a terceira maior bilheteria de 2011 foi “A Saga Crepúsculo: Amanhecer”).
O que aconteceria com “Perdidos na Noite” se fosse lançado hoje?
Possivelmente sairia direto em DVD, ou seria exibido em quatro salas alternativas em Nova York e São Francisco.
Outros exemplos curiosos:
Em 1967, “A Primeira Noite de um Homem” foi a maior bilheteria do ano. “Bonnie and Clyde” foi a quarta.
“2001”, de Stanley Kubrick, foi a segunda bilheteria de 1968, atrás de “Funny Girl”.
“M.A.S.H.”, a visão ácida de Robert Altman sobre o Vietnã, foi a terceira maior bilheteria de 1970, mesma posição de “Operação França” no ano seguinte.
E não vou nem falar de “O Poderoso Chefão” (1972) e “O Exorcista” (1973), que lideraram as bilheterias em seus respectivos anos.
Isso quer dizer que todos os filmes lançados naquela época eram obras-primas voltadas ao público adulto?
Claro que não. As décadas de 1960 e 70 também foram cheias de diversão escapista para adolescentes, desenhos animados e romances melosos.
“Mogli – O Menino Lobo” foi a segunda bilheteria de 1967; “Romeu e Julieta”, a cafonice suprema de Franco Zeffirelli, foi a quinta maior bilheteria de 1968, e “Se Meu Fusca Falasse” ficou em segundo lugar em 1969.
Ou seja: tinha para todo mundo.
Bem diferente de hoje, quando os cinemas são completamente dominados por continuações, desenhos animados e megaproduções inspiradas em gibis.
Fica a pergunta: o que aconteceu com o tipo de público que lotava os cinemas para ver “Perdidos na Noite”? Morreram, todos? E os filhos e netos desses, onde estão? Vendo “Transformers”?
Piorou o cinema ou piorou o público? Acho que nenhum dos dois. Pelo menos não se deixarmos de lado as generalizações – matemáticas por natureza. Se Perdidos Na Noite fosse lançado hoje talvez tivesse baixa bilheteria pelo mesmo motivo que A Viagem à Lua de Méliès não causaria impacto. O público hoje está habituado a outro tipo de jogo de imagens através das tecnologias, das novas linguagens e coisas do tipo. Talvez um Perdidos na Noite que fosse feito levando em conta essas condições de temperatura e pressão tivesse boa bilheteria. Outra coisa: a oferta de audiovisual hoje é infinitamente maior do que nos anos 70 e 80. Além de diminuição progressiva da quantidade de gente que vai ao cinema. Ou seja, a comparação é injusta.
contra os números não dá pra argumentar. se o levantamento mostra que, entre os campeões de bilheteria, estavam filmes que resistiram ao tempo (pra não dizer que são obras-primas, maravilhosos etc, pq aí a gente entra num certo subjetivismo), então alguma coisa mudou mesmo. talvez o fato de que naquela época não existisse o mercado de DVDs e blue-rays, e tampouco a TV por assinatura. os filmes tinham que ir pras salas de cinema. talvez a produção não fosse tão pulverizada quanto é hoje. basta ver quanta coisa boa a HBO produz, pra ficar num só exemplo. agora, tenho a forte impressão de que o acesso às coisas boas é hoje muito mais fácil que nos anos 70: temos internet, DVDs, TV por assinatura, um monte de festivais de cinema. hoje só vê porcaria quem quer. antigamente vc tinha até a opção de não ver porcaria, mas aí PODERIA ficar um bom tempo sem ver filmes. TALVEZ esses filmaços tenham feito tanto sucesso porque os cinemas conseguiam aglutinar uma platéia muito mais heterogênea que a de hoje, que conta com outros recursos pra satisfazer seus gostos.
Penso como você, inclusive escrevi a mesma coisa no meu comentário abaixo. As mais diversas tecnologias tornaram o que antes era uma obrigação para ver filme (ir ao cinema) em uma opção. E esse é o tipo de opção que um público mais jovem, ávido por sair de casa, vai preferir. Já adultos ocupados com suas próprias vidas talvez prefiram o conforto de assistir em casa mesmo. Sem contar que é muito mais fácil os jovens verem os filmes em ‘turma’ do que adultos. E toda essa pressa de ver um filme na semana, ou mesmo na estréia, é típica da juventude. Boa parte da ‘sorte’ de um filme depende, hoje, de uma boa primeira semana, caso contrário já perde espaço para as próximas estreias. Todos esses fatores favorecem um público jovem em detrimento de um público mais envelhecido.
Curioso é que essa “elite intelectual” brasileira tão “di profundis” como diria mussum só conseguia produzir pornochanchada.
Uma curiosidade: um dos primeiros filmes da minha infância que eu aluguei foi The Dark Crystal (Cristal Encantado – Jim Henson) nos agora distantes anos 80. Um detalhe interessante: eu assisti legendado, porque na época não havia tanta dublagem. Só com bonecos, o filme é muito bizarro, fiquei impressionado na época. O imdb conta que foi um fracasso de bilheteria, pois as mães acharam muito assustador para as crianças e estava competindo com “ET” nos cinemas. Porém, estão aí dois filmes infantis dos anos 80 que não agrediam a inteligência da criançada. Como fala Scorcese no documentário “A decade under the influence”, só existem um Spielberg e Lucas (que há tempos só fazem lixo). Acrescento o Jim Henson, que tb fez o bom Labirinto. Quem colocaria o bizarro David Bowie em um filme infantil, só ele!!!
Não é só com o cinema, Barça, mas também com a música. Porcarias também faziam sucesso antigamente, mas havia várias bandas ótimas integrando as top parades; hoje, a situação é inversa, tal qual no cinema. Dá pra dizer que estamos vivendo um fenômeno cultural muito mais amplo, e não algo restrito apenas à sétima arte.
Insane ma man! Roll a joint and let the love rule.
André, você já matou a charada: 80% do pessoal está vendo Transformers. O mundo mudou,as pessoas mudaram. Achei bem legal que O Artista tenha ganho o Oscar, apesar de críticos considerarem esse filme bem menos interessante que outros, porque, de certo modo, ele traz, em seu rastro, um punhado de conceitos e informações que, a meu ver, são necessárias para alterar um pouco a nossa percepção do mundo.
Tem tudo para piorar,infelizmente. Mas o que ajudou a detonar a qualidade foram (infelizmente) as inovações tecnológicas, ou seja, os famigerados efeitos especiais. Agora todo mundo vai ver um filme em busca de super imagens explícitas,explosões mirabolantes, ultra realismo boboca e todo tipo de peripécias visual e sonora. No futuro seremos idiotas em 3D.
Moro no Rio de Janeiro, mas minha família é de Manaus. Por lá a coisa é bem pior. Só há cinemas em shopping e praticamente todas as salas são voltadas para o público infantil. Meus amigos da minha idade (tenho 23 anos) só têm uma opção: o torrent. Sei que Manaus não é uma cidade mt grande, mas poderiam oferecer algo melhor. Há procura por isso. No entanto, os distribuidores devem pensar que Manaus deve ser habitada apenas por crianças.
No meio de todo esse debate devemos fazer também uma justa separação entre: diversão escapista x blockbuster caça-níqueis. Sobre o primeiro eu não tenho nada contra…
“Perdidos na Noite” é um dos meus 20 filmes favoritos de todos os tempos. Li o livro depois e fiquei ainda mais fã do filme: a adaptação para o cinema superou, de longe, a obra literária. Isso pra não falar da belíssima música tema (foi regravada pelo Faith No More, inclusive) e as canções do Nilsson. Impressionante pensar que isso era cinema consumido por multidões. Nada a ver com nostalgia, até porque ainda se faz muita coisa boa, mas o cinema popular nunca foi tão sem vergonha como hoje. Ou o público é que piorou mesmo.
minha explicação é que a idade mental de grande parte do público adulto consumidor é a mesma do público adolescente.
As pessoas se transformaram em idiotas.
Quanto tinha 15 anos eu ia frequentava um clube aqui na minha cidade onde tinha bailes e era comum ouvir numa mesma noite KLF, The Farm, EMF, Legião Urbana, U2, Ramones, Right Said Fred, Ozzy Osborne etc…sabe o que se ouve lá hoje? FUNK.
Quanto eu tinha 15 anos se você fosse jovem e nego te pegasse ouvindo sertanejo tirava sarro da tua cara, hoje é moda…as gerações atuais são definitivamente mais imbecis, o cinema é só outro aspecto desse mesmo fenômeno.
Caro Barcinski, leio esporadicamente o seu blog e dessa vez não pude deixar de comentar, pois o seu texto sobre a infantilização do cinema foi um dos poucos do qual concordei totalmente. Pode-se ampliar mais a questão ao lembrar que a musica também passa por um dos piores momentos da sua história. Gostaria que você comentasse também sobre a infantilização da musica. (restart , britney spears, sertanejo universitario e etc)
As decadas passadas tiveram: menudos, backstreet boys, duran duran, pearl jam, e pq nao dizer da primeira faze dos beatles? isso so pra dar um exemplo
Bandinhas comerciais grudentas-Pega-menininhas sempre existiram, nossa epoca nao perde nem ganha em nada para as outras
Não é verdade. Nos anos 60, 70, o artista pra tocar na radio tinha que ser bom pra caralho. Não existia talento fake, não existia meio termo, a musica pra vender tinha que ser da maior qualidade, ou nem chegava perto de uma gravadora.
Roberto carlos deve ser um grande exemplo dessa sua ideia, e “La Bamba” um marco pro sentido estetico da musica moderna certo?
cara se liga, nao importa a epoca, pras gravadoras, musica boa é aquela que vende, nao dao a minima se “é boa pra caralho” ou se é uma bosta. se vc abandonar a nostalgia talvez vc perceba que Ritchie Valens e restarte nao é tao diferente.
Na decada de 70 o Raul fez uma musica chamada: “a verdade sobre a nostalgia”. esta musica é uma critica a geraçao de 70 que nao dava valor a musica de sua epoca e engrandecia a musica da decada de 50. hj em dia a galera critica nossa epoca e engrandece a decada de 70.
Daqui 20 anos a nossa epoca é que vai ser a boa e a deles uma merda.
Nostalgia é uma merda, tem sorte quem sabe aproveitar tudo que rola.
Tanto no cinema como no setor musical nosso público piorou e piorou muito. Caso contrário não estariamos ouvindo as músicas atuais(autênticas porcarias) e nem vendo ser exibido filmes feitos só de recursos audiovisuais…
Barça…não sei se vc reparou na entrega do Oscar naquele esquete com o teste de audiência com o Mágico de Oz…onde os telespectadores sugeriram tirar a Doroth do filme, cortar a música, etc…claro que essas mudanças iam tirar a essência do filme…e a brincadeira era ridicularizar os testes de audiência caso existissem no passado…mas a ironia que eles não devem ter percebido ou não se dão conta é que graças a não existência deles foram realizadas obras-primas (além da ousadia dos autores,cineastas,etc)…justamente o contrário do que vemos atualmente e que está contribuindo pra decadência do cinema de qualidade…acho que eles tentaram fazer uma piada mas na verdade dão um tiro no próprio pé…
Complementando: brincaram com o passado mas a piada está no presente…ei…até daria um post legal…o que mudariam nos grandes filmes da década de 70 se eles passassem pelos testes de audiência…rsss
Sim, é exatamente isso.
eu acho que as pessoas sempre foram idiotas, mas agora com a internet a idiotice ficou mais pública e generalizada. alguém disse aí que tem esse lance do modelo dos grandes estúdios estar ameaçado por outras formas de divulgação de filmes, e acho que a estrada é por aí. os tubarões vão apostar no filme fodão subversivo de um diretor que está surgindo ou na enésima continuação daquela saga dos quadrinhos que paga todas as contas? outra coisa que eu noto é que quanto maior o orçamento, mais o filme é for dummies, porque aí atinge mais gente (dá pra ver isso na tristeza que foi as continuações de matrix e o mal que o orçamento milionário causou pra história do filme, mas são muitos os exemplos).
o que toca na fm? Não é o mesmo fenômeno histórico?
alguns morreram, 94,3% dos filhos e netos assistem, e gostam, de transformer, e os vivos esperam o telecine, hbo ou cinetorrent
Acredito que a explicação seja mais tecnológica do que qualquer outra coisa.
Explico: antigamente, ir ao cinema era praticamente a única forma de se assistir a um filme. A partir do VHS, no entanto, sucedido pelo DVD e a cópia digital, o acesso aos filmes ficou gradativamente mais facilitado. A partir disso, ocorreram dois fenômenos: (1) quem gosta de cinema pode se entreter com filmes antigos que foram lançados em todas as épocas e (2) mesmo que se interessem por algum filme que esteja passando no cinema, podem esperar para vê-los quando saírem na locadora, ou mesmo em alguma cópia no seu computador.
Alguém poderia perguntar: mas isso não aconteceria com o público como um todo? Mas existe uma diferença: o público mais jovem possui, digamos, mais tempo para ir ao cinema, e até se empolga em sair e ver um filme; já um publicado mais envelhecido, com questões como trabalho e responsabilidades familiares, pensará duas vezes antes de se dedicar a todo processo de ir ao cinema. Um outro fator que deve ter contribuído é que, com o aumento da renda média da população, os jovens tenham mais dinheiro para ir ao cinema do que antes, e passaram a se tornar um público alvo relevante.
Eu não tenho nada contra as continuações, os desenhos animados e as megaproduções inspiradas em gibis. Nem nada contra o “Transformers” ou a Saga “Crepusculo”, e outros. Eu até gosto. Assisto a tudo.
Tem muitos filmes bons fora desta safra que foram lançados em 2011 também, mas aí vem o lance: “piorou o público” e não o cinema.
Só p/ citar um: “A Árvore da Vida” de Terrence Malick, eu vi o filme no cinema, que foi recebido de forma perplexa, muita gente saindo no meio, outros zombando da complexidade da narrativa e outros apenas desinteressados, gente mexendo nos seus celulares para passar o tempo.
Há anos que venho constatando o emburrecimento do público, a falta crescente de paciência, estão todos virando loiras burras. Que tal apenas sentir em vez de querer entender tudo literalmente. O público só piora.
Concordo plenamente. Excelente comentário!!!
Barça, dois fatores que considero importantes no tema:
1. A geração dos anos 60 era mais politizada, mais engajada que a de hoje. Alem disso hoje quem quer assistir algum filme mais alternativo baixa lá no cine torrent e não vai aos (pouquissimos) cinemas que exibem esses filmes.
2. Pô velho: The Godfather, 2001 de Kubrick, Midnight Cowboy… o nível dos filmes era melhor. A safra de atores que surgiu na época era extraordinária. Não que a atual seja ruim, mas aquela era acima da média. Hoje não temos filmes nesse nível para grandes públicos. Os bons filmes de hoje são só mesmo para os cinéfilos de carteirinha e para os críticos carecas que frequentam cineclubes.
Acho que tem um outro lado também. O público pseudo-intelectual-esnobe NÃO quer que seus filmes sejam vistos pelo grande público. Querem que eles fiquem escondidos, que só eles conheçam. Se o filme faz sucesso o diretor é “vendido” (o que acontece com bandas também). E esse pensamento de certa forma acabou contaminando essa industria.
Outro lado é que se a pessoa não for de São Paulo ou Rio de Janeiro também dificilmente tem acesso a esses filmes.
Mesmo baixar na internet é difícil, procure por Crepúsculo e encontre 20000 resultados, agora tenta um filme mais interessante e vê se acha algum para baixar.
E por fim, hoje as pessoas tem idéias diferentes de diversão…Cinema virou uma baderna sem fim, ninguém quer prestar atenção no filme para entender, querem é tudo mastigado e claro, explosões e efeitos especiais.
É o mesmo com a música, uma vez havia Pink Floyd, Deep Purple, Mahavishnu Orchestra, Return To Forever, Grand Funk Railroad,etc.
Hoje temos …
Tá, tá, agora chega de papagaiada de Oscar, vai… Quando vc volta a escrever sobre música, Barcinski?
Barça, é um excelente ponto que você faz e é bem explorado no livro “Como a greação sexo, drogas e rock’n’roll salvou Hollywood”. No final dos anos 60, os filmes estreavam gradualmente, primeiro em cinemas de NY e LA, e de acordo com o sucesso deles nessas cidades, no resto do país.
Com o sucesso estrondoso de filmes como “O Exorcista” e “Poderoso Chefão”, estúdios começaram a lançar filmes em centenas de salas ao mesmo tempo aliadas a campanhas de marketing maciças. Daí começaram expectativas que abriram caminho para os blockbusters atuais.
Antigamente, o filme era blockbuster por sua qualidade e o boca-a-boca gerado pelas estreias em NY e LA. Hoje em dia, como o doc feito a partir do livro, os estúdios fazem versões milionárias de filmes do Roger Corman.
Acho que são os principais fatores da mediocrização humana: educação muito mais liberal dos pais hoje (passam a mimar demais os seus filhos); pais mais tempo no trabalho do que com os filhos (filhos ficam mais com os amigos, que viraram seus modelos de referência) e mundo mais imediatista. Sem mais fortes referências paternas e sob más influências externas deixaram as mais recentes gerações mais idiotas, e hoje isso se reflete na cultura em geral…Vivemos também na ditadura da moda. Temos que gostar de tudo o que os outros ouvem, veem, comem, de como se vestem, se a franja do cabelo que que ficar do lado direito ou esquerdo, etc… se não gostar do que todos os outros gostam você fica de fora…A falta de personalidade das pessoas hoje é o que mais me impressiona.
Acho o que mudou foi a ganância dos estúdios, que preferem hoje faturar altos com blockbusters rasos do que arriscar dar certo ou não com filmes de temática mais adulta ou que exijam mais do cérebro de um Homer Simpson
Oi, André. Bem legal o texto. Fiquei com uma dúvida: No livro que você menciona no texto, o “box-office hits”, existe alguma menção à maneira como os filmes eram divulgados na época de seu lançamento? Como as pessoas ficavam sabendo de um filme como “Perdidos na Noite”, e do seu enredo? Era só com trailers de cinema e cartazes, ou havia algo mais?
Estou perguntando isso porque acho que, além da evidente infantilização do público dos cinemas, outra coisa que explica o declínio das bilheterias de filmes mais adultos e relevantes é a falta de divulgação (e, às vezes, até interesse) por parte dos estúdios e distribuidoras.
Acho que isso fica bem claro no caso de “Tropa de Elite 2” – é um filme adulto, relevante e que foi um sucesso de bilheteria. Mas isso porque o estúdio acreditou no filme, viu que valia a pena divulgá-lo, e que o público se interessou bastante pelo primeiro filme (ainda que às custas da pirataria; mas se o filme não tivesse atraído o público, não teriam sido veiculadas tantas cópias piratas). Será que, se os estúdios e distribuidoras não se “esforçassem” (não sei se essa é a palavra ideal) mais em produzir e divulgar seus filmes de forma maciça não atraririam justamente a fatia de público que deixou de ir no cinema justamente por achar que ele virou um grande parque de diversões? É o que eu penso.
Olha, sugiro a vc ler o livro do Peter Biskind, ele fala bastante de como os estúdios passaram a massificar a divulgação dos filmes depois de “Tubarão”. A consequência foi uma queda de importância da opinião de críticos. Vale a leitura.
Além das informações legais sobre o cinema americano dos anos 70 esse livro é muito divertido.
me lembro quando eu era adolescente, e isso faz tempo, tinha sempre alguem mais velho que vinha com esse papo: ” esses filmes de hoje nao tao com nada, bons eram os filmes da minha epoca, etc, etc, etc”. quem viveu nos anos 20 prefere os filmes desta decada aos das decadas seguintes e assim sucessivamente, estou falando do publico em geral e nao de criticos ou cinefilos, que e o caso dos debatedores aqui. o que eu sei e que se fossemos prestar atencao a esse discurso o homem voltaria a viver no tempo das cavernas porque parece que sempre o antigo era melhor. o que aconteceu e que a industria, seja qual for, parece nao estar mais interessada em atender nichos, ou o lucro e exorbitante ou nao se investe em nada, e a padronizacao, seja da “alta” ou da “baixa” cultura, e uma merda!
Cleibson Carlos, sua linha de raciocínio admite também o inverso, o que a invalida de imediato: em todas as épocas sempre teve quem dissesse “a melhor época do mundo é agora, no presente” ou “não vamos desanimar, no futuro será ainda melhor” – neste caso teríamos que nos mudar imediatamente em Marte ou Júpiter. Penso que tanto a abordagem voltada ao passado quanto ao futuro são necessárias e bem vindas, desde que com o enfoque correto (sem nostalgia, sem deslumbrado apego ao presente e sem futurologia).
renato, eu acho que o ser humano e o animal mais idiota do universo justamente por causa desta sua linha de raciocinio: tao nostalgico do passado e temeroso do futuro que esquece de viver o presente. estou para ver uma pessoa da minha faixa etaria que diga que o presente e a melhor fase de suas vidas! felizes sao os jovens, e quando digo jovens nao quero dizer apenas pessoas de determinada faixa etaria, que nao tem tempo para pensar no passado ou no futuro porque estao vivendo o presente.
Cleibsom, o presente não é a melhor nem a pior fase, por um motivo muito simples: o presente é a única fase, é impossível viver em outra época. Portanto, teríamos que abordar essa questão do ponto de vista psicológico e não cultural ou antropológico. Não entendo por qual motivo você contrapõe presente (no seu exemplo dos jovens, de idade ou de espírito) a passado e futuro: se você não sabe de onde vem nem sabe pra onde vai, você é alguém sem identidade e sem propósito. Viver no presente, só por viver, não basta, é preciso construir uma biografia e neste sentido o passado me parece bem importante, pessoal e historicamente.
renato, e evidente que o presente e a unica fase que podemos viver, isto e obvio, mas o ser humano nao se preocupa com ele porque e nostalgico do passado e esperancoso ou temeroso do futuro. sei que esse papo e meio filosofico e chato, mas e nisso que eu acredito…acho impossivel escrevermos o passado com os olhos do presente porque esta descricao sempre sera idealizada e ideologica, a crianca que eu penso ter sido certamente nao e a crianca que eu fui!
Cleibsom, “pode” ser desse jeito que você afirma mas não necessariamente, depende da abordagem. Não há uma regra nem um imperativo categórico para se abordar passado ou futuro. O apego ao passado pode ser, por exemplo, uma defesa natural em alguém que está se sentindo defasado em relação ao seu presente, à sua capacidade de interação com a realidade atual (por uma série de motivos) e ainda não sente clareza quanto a (ou força para se posicionar frente a) isto, então expressa dizendo “no meu tempo era muito melhor” – e se ela acha melhor, é porque naquela época a pessoa vivia plenamente seu presente, concorda? Enfim, considero superficial dizer apenas que as pessoas estão apegadas nostalgicamente ao passado e perdendo o presente, há bastante material complexo aí que merece uma abordagem mais cuidadosa.
renato, e ai que esta o x da questao e a ironia de tudo, o passado quando estava sendo vivido nao tinha nada de lindo…e por isso que digo que o passado e idealizado. minha vida aos 15 anos nao tinha nada demais quando eu a estava vivendo, mas hoje, ao pensar naqueles anos, se eu nao tomar cuidado vou romantizar mesmo o mais banal dos acontecimentos…
Cleibsom, se o passado não tinha nada de lindo, de especial, por qual motivo o presente teria? Que justificativa você daria para alguém viver no presente e sem nostalgia, já que este presente um dia será um passado sem nada de especial, pelo seu raciocínio? Não dá pra entender isso. Achar que no passado não tinha nada de mais é tão nocivo quanto achar que era tudo uma maravilha.
renato, eu nao sei a sua idade mas, por exemplo, se voce pensar em sua vida dez anos atras, mesmo que ela fosse um tedio, a sua visao de hoje sobre seu passado sera idealizada e romantica, o ser humano em sua maioria e assim…nao tenho duvidas que daqui a dez anos as pessoas estarao relembrando nostalgicamente de 2012, mas nao e por questao de escolha que o ser humano viva desse jeito, talvez seja algo natural a medida que o mundo vai mudando e tudo aquilo que gostavamos no passado perde o sentido e o valor para as novas geracoes…