Dez grandes reportagens em dez grandes livros
05/03/12 07:34
Um leitor pediu, e aí vai: uma lista de dez ótimos livros-reportagens.
Note bem, não são biografias, mas livros sobre um determinado acontecimento histórico.
Tentei evitar os mais óbvios. Seria moleza indicar “Dez Dias Que Abalaram o Mundo” (John Reed), “Todos os Homens do Presidente” (Bernstein & Woodward), “Hiroshima” (John Hersey), “A Sangue Frio” (Truman Capote) ou “A Selva” (Upton Sinclair). São todos clássicos absolutos e precisam ser lidos.
Optei por livros que saíram no Brasil. Alguns estão em catálogo, outros podem ser achados em sebos (procure no www.estantevirtual.com.br).
Aqui vão, em ordem cronológica, dez livros marcantes, sobre temas idem:
Operação Massacre – Rodolfo Walsh, 1957
Inédito no Brasil até o ano passado, o livro conta a história de um fracassado contragolpe de Estado peronista, em 1956. Os líderes são presos e fuzilados, assim como vários operários que não tinham nada a ver com a história.
“Operação Massacre” é um livro pioneiro do “new journalism”, estilo que misturava reportagem a textos mais autorais e livres.
Walsh era um homem de extremos: direitista na juventude, passou a apoiar a luta armada de esquerda nos anos 70, e acabou morto pela ditadura militar argentina.
O Segredo de Joe Gould – Joseph Mitchel, 1965
Eu disse que não incluiria biografias nessa lista, e esse livro, apesar de parecer, não é uma biografia comum, mas um relato sobre a vida do bairro boêmio de Greenwich Village dos anos 20 e 30, centrado em uma de suas figuras mais emblemáticas, Joe Gould, um maltrapilho que andava pelo bairro falando de seu projeto monumental, “A História Oral do Nosso Tempo”.
O livro marcou a consagração e, curiosamente, o fim da carreira de Mitchell, um dos escritores mais famosos do staff da “New Yorker” e que não conseguiu escrever mais nada até sua morte, em 1996.
Hell’s Angels – Hunter Thompson, 1966
Meu livro predileto de Thompson é “Medo e Delírio” (“Fear and Loathing in Las Vegas”), mas confesso que não sei se é reportagem ou ficção (talvez nem o próprio Hunter soubesse).
Fico então com “Hell’s Angels”, primeiro livro de Thompson, sobre a gangue de motociclistas que aterrorizava a Califórnia. Saiu por aqui pela Conrad.
Todo mundo adorou o livro. Menos os Hell’s Angels, que quase mataram Hunter de tanta pancada, depois que ele chamou a atenção de um deles por bater na mulher.
Honra Teu Pai / Os Honrados Mafiosos (Honor Thy Father) – Gay Talese, 1971
Pensei em escolher “O Poder e o Reino”, história do “The New York Times”, mas optei por “Os Honrados Mafiosos”, que foi relançado recentemente no Brasil.
O livro conta a história da família Bonanno e sua luta contra clãs rivais da Máfia italiana nos Estados Unidos. Foi um “best seller” e é, até hoje, um dos textos clássicos do “new journalism”.
Tempo Para Morrer (The Onion Field) – Joseph Wambaugh, 1973
Em 1963, na Califórnia, dois bandidos pés-de-chinelo são parados por um carro da polícia. Eles seqüestram os dois policiais e os levam para uma plantação de cebolas, com o objetivo de executá-los. Um dos policiais é morto, mas o outro consegue escapar.
Wambaugh traça um perfil dos quatro personagens da história – os dois bandidos e os dois policiais – e relata não só o crime, mas os muitos anos do processo jurídico kafkiano que se segue. Um livro muito triste e emocionante.
Manson (Helter Skelter) – Vincent Bugliosi e Curt Gentry, 1974
Bugliosi foi o promotor que ajudou a condenar Charles Manson e sua gangue pelos assassinatos de Sharon Tate, mulher do cineasta Roman Polanski, e de quatro outras pessoas, em 1969.
O livro conta em detalhes o crime e o julgamento de Manson e de seus seguidores fanáticos. É apavorante. Foi o livro-reportagem mais vendido da história.
A Luta – Norman Mailer, 1975
Nunca houve uma luta de boxe como a de Muhammad Ali e George Foreman, no Zaire, em 1974. Norman Mailer estava lá e conta tudo: o fanatismo da torcida local, a miséria do país e a brutalidade de seu ditador, Mobutu. Mas o melhor é mesmo a descrição da luta. Leia e depois assista a “Quando Éramos Reis”, documentário sensacional sobre o combate, em que o próprio Mailer aparece.
Aracelli, Meu Amor – José Louzeiro, 1976
O caso Aracelli marcou época. Em 1973, na cidade de Serra, próxima a Vitória, uma menina de 8 anos não voltou para casa depois da aula. Seu corpo foi encontrado num matagal, com sinais de tortura e abuso sexual.
Suspeitas recaíram sobre dois playboys, filhos de famílias ricas e influentes do Espírito Santo. Depois, surgiram indícios de que a própria mãe da menina, uma boliviana que faria parte do tráfico internacional de cocaína, teria usado a filha como “mula”.
José Louzeiro, autor de “Infância dos Mortos”, livro que inspirou o filme “Pixote”, lançou em 76 esse livro sombrio e revoltante sobre o caso Aracelli.
Barbarians at the Gate – Bryan Burrough & John Helyar, 1990
Não achei nenhuma informação sobre o lançamento desse livro em português. Se você lê em inglês, não perca. Se não lê, pode assistir ao ótimo filme que a HBO fez em 1993, “Selvagens em Wall Street”, inspirado no livro.
“Barbarians at the Gate”, considerado por alguns o melhor livro sobre negócios já escrito, conta a batalha – de egos e dinheiro – pela empresa RJR Nabisco, em 1988. O tema continua atualíssimo.
Gostaríamos de Informá-lo de que Amanhã Seremos Mortos Com Nossas Famílias – Phillip Gourevitch, 1998
Gourevitch, que escreve para a “New Yorker”, relata cem dias do genocídio da maioria hutu contra a minoria tutsi em Ruanda, em 1994, que matou mais de 800 mil pessoas, a maioria com machetes e facões. É um dos livros mais arrasadores que já li.
Não me interessei.
André, você já leu “Os Eleitos” , de Tom Wolfe, sobre os pilotos de provas que se tornaram (alguns deles) os astronautas do primeiro projeto espacial americano? Eu gostei bastante (inclusive do filme dirigido por Philip Kaufman). Recomendo livro e filme.
Só vi o filme, achei ótimo.
Ótima lembrança, o livro e o filme realmente são ótimos.
Prezado,
nenhum autor local que mereça estar na lista?…
Abs.
Vandeck
Prezado,
Não percebeu o José Louzeiro na lista?
Vendo (só) agora…
vi ontem umdocumentário sobre a cena black metal na Noroega e fiquei chocado. Já tinha ouvido falar das igrejas incendiadas, mas suicídio na capa de disco e todo discurso anti-cristão foi novidade. Recomendo “Until the light takes us”. E acabei descobrindo que lá a pena máxima é de 21 anos.
Cara, sabia que enche esta história de “soco no estômago”? Porque todo crítico só fala isso hoje em dia? Não tem um termo diferente? Tipo… um baque, um choque, sei lá…
André, eu acho que o nome em prtuguês desse livro do Gay Talease é Honra teu pai.
Sério ,eu tava passando por uma livraria esses dias e dei de cara com ele…
Ou eu tô loco ou sei lá….
Abraços
Caio,
Só se for da edição nova. Tenho a original, que saiu no Brasil nos anos 70. Tá aqui na minha frente e chama “Os Honrados Mafiosos”. Mas vou colocar os dois títulos no post, em todo caso. Obrigado.
Caio, tem a edição nova que a Companhia das Letras lançou recentemente. O título é “Honra teu pai”, sim.
abraços
Honor Thy Father foi relançado com o “novo nome” Honra teu Pai, pela Companhia das Letras no começo do ano passado.
Este livro foi publicado no Brasil na década de 70 com o nome de Os Honrados Mafiosos e não era nada fácil achar. Tanto o que eu tenho aqui é uma edição surrada da editora Expressão e Culrura de 73 que comprei em um sebo.
Ah, o livro é sensacional!
Gostei muito de O jornalista e o assassino, de janet malcolm. Fica minha dica pra quem tiver interesse.
Sobre o que é?
é sobre a história de um médico que foi condenado pelo assassinato da esposa e das duas filhas e processou o jornalista que escreveu um livro sobre ele, com base nas reportagens feitas para o NY Times. Uma terceira pessoa, a autora deste livro (Janet Malcolm) analisou todo o material e fez este livraco. Tb é legal pq ela pontua temas que poderiam ser batidos em comunicação, como a ética do jornalismo e a liberdade de imprensa, mas que sempre precisam ser questionados.
Oi André, desculpe comentar novamente, mas me lembrei. Você chegou a ler aquele livro sobre o Dinamo de Kiev na 2a Guerra, que conta a história dos jogadores sendo presos em campos de concentração (Futebol e Guerra, do Andy Dougan)? Esse livro podia estar nessa sua lista!
Ainda não, Marcel, vacilei. Vou atrás já já.
Esse livro é fantástico! “Futebol e Guerra”. Vale muito a pena!
Revoltante saber que ninguém foi punido nesse caso hediondo da menina Aracelli, esse fato diz muito sobre a nossa sociedade e sobre a impunidade.
Li “Hell’s Angels”, na edição da Conrad, mas não me marcou muito. Hunter Thompson tem um texto bacana, mas o mundo dos hell’s angels não é lá muito interessante.
NÃO?????????
visualizo altas aventuras na turma do Paulo! Hell’s Angels são pinto perto da galera super aloprada que Paulo conhece!
Paulo não, Eduardo. (de onde tirei Paulo?)
No fundo, Paulo atrás.
Maria, quando li o livro achei os caras apenas um bando de boçais. Talvez eu precise reler, mas foi a impressão que tive na época.
Barsinski:
a lista é demais, valeu.
eu não consegui desgrudar a carcaça do livro Zodíaco, de Robert Graysmith, em sua versão semi tijolo de bolso. Repleto em detalhes, por vezes deixando a literatura de lado e mesmo muito influenciado por Stephen King, a história do serial killer que fez o que bem entendeu nas barbas da polícia e do FBI. Foi lançada uma versão aqui no Brasil em 2007.
Aterrorizante na medida.
Medo e Delirio é fascinante,imperdível,mas concordo,Hell´s Angels me decepcionou.
Só vi o filme, e adorei.
Oi!
tirando de lado os classicos…nem vou falar de Gay Talese…
Conhece um que chama “Minhas viagens com heródoto?” Do Kapusinsky?
Não, do que se trata?
É um livro reportagem de um jornalista polonês, que ao viajar pela África e Ásia cobrindo massacres dos ditadores locais faz um paralelo com os relatos de Heródoto sobre as guerras gregas contra os persas.
O livro é simplesmente fenomenal.
“Os Sertões”!
Eu apenas adicionaria “the kool electric ais acid test”, do Tom Wolf (sobre Ken Kesey e os malucos de acido) e substituiria o do Talese, colocando “A Mulher do Próximo”, sobre a revolução sexual nos EUA.
Na mosca, Rodrigo. Esses dois estão definitamente entre os melhores. O do Tom Wolfe foi lançado em português como O teste do ácido do refresco elétrico: conta a história dos pioneiros do lsd nos EUA, incluindo o Ken Kesey, autor do livro Um estranho no ninho, que depois virou filme do Milos Forman.
Valeu, Pedro. To nas ultimas páginas do “Refrersco Elétrico”. Sensacional! E você, Barca, nao conhece?
Já li muito sobre o livro e sobre o Ken Kesey, mas nunca li o livro não.
Outro é o Please Kill Me (ou Mate-me, por favor no Brasil), escrito por Larry “Legs ” McNeil. Biblia do Punk. Sem mais descrições.
Barça, sobre “Todos os Homens do Presidente”, o filme retratou bem como a história foi escrita no livro? No filme, parece que os motivos da renúncia do Nixon são bem retratadas… Acho que é uma das melhores atuações do Dustin Hoffman. Abraço!
Não sei se encaixaria no conceito da lista, mas gostei muito do Ascensão e Queda do Terceiro Reich do William L. Shirer e mais que esse do A Mulher do Próximo do Gay Talese, que simplesmente na conseguia parar de ler, o tema do livro é basicamente o comportamento sexual dos americanos nas décadas de 60 e 70 e sinceramente é um dos melhores livros que já li. A Luta comprei no final do ano e logo mais vou ler.
Os livros do Shirer são históricos, tentei focar mais em livros sobre temas mais específicos e não tão amplos.
Gostei muito da lista, parabéns. Só tem um problema, vou ter que viver duas vidas para ler tudo o pretendo ler.
Acabei de ler a pouco “A Luta”, achei o livro ótimo e com certeza vou atrás do filme. Esse último que você comentou, do Gourevitch, é o mesmo caso retratado no filme “Hotel Ruanda”? 1 abraço,
O caso mostrado em Hotel Ruanda é descrito no livro sim. Mas o livro é mais abrangente.
Um livro que li ultimamente e gostei muito foi o “O piloto de Hitler- A vida e a época de Hans Baur” de C. G. Sweeting. O autor foi contemporâneo, ai ele narra com uma certa sequência os fatos. O Baur faleceu com 93 anos, casou-se 3 vezes e esteve preso na Rússia. detalhe: Não é exatamente uma biografia do cara, conta como ele encontrava-se dado o momento histórico. O texto vai citando o avanço da indústria aérea dentro e fora do contexto da guerra. Recomendo!
Parece fantástico, não conheço.
E é Barça! Pra ter uma idéia, eu ia a praia com ele, deixava a mulher e o mar de lado (risos). O cara era um ás da aviação (Lufthansa) e o texto é rico em detalhes. O cara foi o único a discordar do Hitler (sobre vegetarianismo) e ele mesmo contou que, o Fuhrer ordenou que o Hans testemunhasse qual fim dariam ao corpo, depois do suicídio.
Recém postei sobre “O Piloto de Hitler”, o qual recém comprei e vou ler. Comprei junto “A Invenção do Povo Judeu”.
Alguém indica outros para que eu possa entender mais sobre o que foram REALMENTE as guerras mundiais e a EXAGERADA mídia que os judeus fizeram sobre o seu “extermínio”?
Cara, creio que alguma coisa que tenha de exagerada nesta história toda seja a associação de que todo alemão era assassino de judeu. Leia “a policia secreta de hitler” e veja o filme “os falsários”. O primeiro mostra que realmente quem era responsável pelos assassinatos em massa era a Gestapo – aliás, um braço delas as SS – e o segundo mostra que, mesmo alguns das SS não tinham apreço pela matança. OBS: Exagerada foi a carnificina.
Barça, a mais recente edição do “Honor Thy Father”, lançada pela Cia. da Letras, foi traduzida como “Honra Teu Pai”. Aliás, acho o Gay Talese foda, mas meu livro preferido dele é “A Mulher do Próximo”, sobre as mudanças no comportamento sexual nos EUA no século XX. Conhece?
Vixe, não sabia. Tenho a edição antiga dos anos 70, “Os Honrados Mafiosos”. Não li “A Mulher do Próximo”.
André, já anotei o título de uns livros, pois adoro histórias de crime. Você sabe de algum livro bom acerca do caso do OJ Simpson? Certa vez encontrei um, mas as duas páginas que li deixaram claro que era porcaria.
O livro do Louzeiro me fez lembrar do famoso “Caso Carlinhos”, lembra dessa história escabrosa, Barça? Lembro que foi um negócio que comoveu todo o país e mesmo anos depois todo mundo lembrava disso. Que eu saiba não teve solução mas algumas pistas apontam para algo ainda mais terrível do que poderíamos imaginar, como se o sumiço inexplicável de uma criança não bastasse. http://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_Carlinhos
André, valeu pelas dicas. Quando você indicou os livros do Mário Vargs Llosa li “A Festa do Bode” e “A Guerra do Fim do Mundo”. E antes tinha como autor Umberto Eco e hoje considero o autor peruano o meu preferido.
Mais uma vez valeu!
Barcinski, deixo aqui duas sugestões de leitura: uma é “Lúcio Flavio, o Passageiro da Agonia”, do José Louzeiro, que na minha opinião retrata de maneira brilhante uma certa parte “escondida” do Brasil nos anos setenta. O outro é “Gomorra”, do jornalista italiano Roberto Saviano, que desnuda em detalhes todas as atividades da Máfia Napolitana neste inicio de século XXI. Ah, uma curiosidade: esses dois livros deram origem a dois filmes interessantissimos!
André, li há algum tempo um excelente livro-reportagemque se chama “O Vulto das Torres”. Acho que vale a pena.
Outra coisa, no ano passado você falou sobre um livro que trata sobre a máfia no mundo ou alguma coisa parecida. Qual o nome dele?
Abraço
É muito bom, do Lawrence Wright, sobre a história por trás do ataque de 2001. O livro sobre a máfia se chama McMáfia, de Sasha Glenny.
Este livro sobre o WTC em 2001 mostra a farsa americana ou reforça a “REFARSA ” que foram apenas ataques terroristas.
Vais dizer que o Bush NÃO sabia do que ia acontecer???
Eu acho incrível a sua capacidade de resenhar livros e filmes, Barça. Eu sempre fico agoniada não poder começar a ler/assistir todos os livros que você indica logo depois de ler seu post.
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3
Me chamou a atenção a presença marcante de colaboradores de revista New Yorker. Êta revista porreta esta, não…? Fui dar uma pesquisada no assunto e fiquei mais impressionado ainda: http://en.wikipedia.org/wiki/List_of_The_New_Yorker_contributors
Barcinski, como sempre nos indicando livros e filmes de qualidade para lermos e assistirmos. Valeu, Barça! Vejo o teu blog diariamente. É leitura diária obrigatória para mim.
acho que “a luta” está para o boxe assim como “o sol tb se levanta” está para as touradas.
Acho que em “O Sol Também se Levanta” a tourada é apenas o pano de fundo para assuntos muito mais interessantes relacionados à condição humana. “Morte à Tarde” sim, é um livro-reportagem sobre touradas.
Olá Barcinski, tudo bem ? Excelente lista de livros. Minha dica é o livro “já considerado clássico” sobre o massacre lento e sistemático dos índios norte-americanos, “Enterrem meu coração na curva do rio”, do escritor e historiador Dee Brown. Fácil de encontrar, numa edição “pocket,” em bancas de jornais. Um grande abraço !
Excelente dica, nem me lembrei.