Sexo, drogas e chucrute: o rock alemão está em todo lugar
03/04/12 07:15
Já ouviu falar de Julian Cope?
Cope teve uma banda em Liverpool com Ian McCulloch, fundou o cultuado grupo pós-punk Teardrop Explodes, pirou de ácido, iniciou uma turbulenta carreira solo, escreveu livros sobre cultura neolítica e antigos monumentos da Europa, estudou ocultismo e shamanismo, e é considerado um dos grandes especialistas do mundo em rock japonês. Um cara singular.
Em 1995, Cope escreveu “Krautrocksampler”, livro que conta a história do rock alemão do fim dos anos 60.
Cope era obcecado por grupos como Can, Faust, Neu!, Kraftwerk, Ash Ra Tempel, Amon Duul, Tangerine Dream, Popol Vuh e tantos outros, e resolveu contar a história desse importante movimento musical.
Naquela época, havia pouquíssima literatura sobre o tema.
Os músicos que viriam a formar esses grupos cresceram nos escombros da Segunda Guerra, lidando com a sombra de seu passado nazista e a necessidade de criação de uma “nova” Alemanha.
Muitos partiram em viagens radicais. Estudaram música dodecafônica, piraram com os experimentos sônicos de Stockhausen e Sun Ra, e renegaram o comercialismo do pop.
Ao mesmo tempo, eram fanáticos por Velvet Undergound, Stooges e Frank Zappa, e sonhavam em fazer rock diferente do que ouviam nas paradas inglesas e americanas.
No livro, Cope cita outra influência marcante para essa geração: o The Monks, uma banda de garagem formada por militares americanos em serviço na Alemanha nos anos 60.
O movimento ganhou um nome – krautrock – curiosamente aceito pelas bandas, apesar de “kraut” (de “sauerkraut”, ou chucrute) ser um termo pejorativo usado na época da Guerra para se referir aos alemães.
Estilisticamente, é impossível definir o krautock, tamanha sua variedade de sons e estilos.
Num disco do Neu! ou do Can, por exemplo, é possível identificar ecos do pré-punk de Stooges, experimentos com eletrônica, mantras repetidos à exaustão, e pirações que lembravam as viagens de um Captain Beefheart. Era o rock mais livre do mundo.
O impacto do krautrock foi imenso. Howard Devoto, fãzaço do Neu!, saiu do Buzzcocks decepcionado com o punk e fundou o Magazine. John Lydon largou o Sex Pistols e criou o Public Image Ltd., basicamente a sua versão para a música do Can, por quem era fanático.
A lista é imensa: de Fugazi a Sonic Youth, de Horrors a My Bloody Valentine, de Mission of Burma a Simple Minds (acredite!), todo mundo bebeu no krautrock.
Quer exemplos mais concretos? Então ouça “Mushroom”, do Can, e compare com “Last Living Souls”, do Gorillaz; ou o primeiro disco do Neu! seguido por “Embryonic”, do Flaming Lips. Diabos, ouça qualquer disco do Radiohead pós-“Kid A”. É krautrock puro.
Voltando a Julian Cope: “Krautrocksampler” fez um barulhinho na época, mas rapidamente sumiu de circulação. Hoje, um exemplar sai por 200 a 300 euros no Ebay.
Até que os abençoados editores do blog Swan Fungus resolveram fazer um favor ao planeta: escanearam todas as páginas do livro e o disponibilizaram de graça, aqui.
Mesmo se você não lê em inglês, vale a pena baixar, só pela lista dos 50 discos fundamentais do krautrock, escolhidos por Julian Cope.
E para quem tem preguiça de ouvir 50, recomendo três para começar: “Tago Mago” (1971) do Can, “Neu ‘75”, do Neu! e “Yeti” (1970), do Amon Duul II. E boa viagem…
O rock alemão é muito mais do que Scorpions e Helloween.
Accept ?
Mekong Delta ?
bom, certamente o mais duradouro é Udo Linderberg.
Li uma entrevista do Mark Lanegan dizendo que tb foi muito influenciado pelo krautrock durante o período de composição do Blues Funeral. Em músicas como Ode To Sad Disco, ficam bem claras essas influências. Por falar nisso, seria muito bem vindo um post seu sobre o Lanegan, principalmente agora do lançamento desse belo disco que ele acabou de lançar. Abraço!
NEU! é uma banda que eu ouço todo o santo dia. Adoro aquelas viagens experimentais misturadas com aquela pegada proto-punk.
Kraftwerk também é genial. Idem para Can. É uma época fantástica do rock alemão. Pena ser difícil achar os discos e quando se acha, geralmente é muito caro.
Tem um documentário sobre o assunto:
http://www.youtube.com/watch?v=3B89-69icyc
Este documentário é muito bom mesmo. Me lembro que uma das coisas mais interessantes dele foi colocar o Krautrock no contexto da Alemanha pós-guerra e enfatizar que as bandas da época queriam muito fazer algo diferente do que era feito no resto do mundo, principalmente Inglaterra. Já tinha ouvido falar neste livro raro do Julian Cope, valeu pelo link André! abs
A BBC é foda, não? Eles têm um filme legal sobre QUALQUER tema…
Outro exemplo concreto… Halleluwah do Can foi ‘surrupiada’ pelo Happy Mondays.
E o Monks é uma das coisas mais sensacionais que já ouvi.
muito bom valeu.
Documentário do Can, e desta cena, muito bom aqui: http://youtu.be/nm8MjLDbQ2o
Barça, confesso que depois de ler seu post, fui pesquisar sobre o tal “Krautrock”, pois nunca tinha ouvido falar nada sobre isso….. Pelo que li, esse estilo musical é muito próximo do que foi feito na era do rock progressivo… O que me pareceu o grande diferencial é que as bandas surgiram num país devastado pela guerra, o que deu um toque de originalidade no som dos caras. Vou tentar ouvir alguma coisa pra ver se vale a pena… apesar de que acho rock progressivo chato pra caralho.
Tem também a versão chucrute do Emerson, Lake & Palmer, o Triumvirat, que bombou por aqui nos anos setenta, tinha muitos comerciais da época com suas músicas. Letras nonsense alemãs, – um disco se chamava Illusions on a Double Dimple (whatha fuck is that), mas que era conhecido como o disco do ratinho, por causa do camundongo na capa.
Ochi, escutei muitcho naquela época progressiva. Fumar manga rosa e escutar rock alemão, eitcha!
Rock alemão é rico demais. Os anos 70 tiveram bandas sensacionais: Grobschnitt, Eloy, Pancake, Satin Whale, Anyone’s Daughter, Popol Vuh, Jane, Kraan e muitas outras. Eu curto muito até hoje.
…Triumvirat e Grobschnitt
Sei que aqui é território meio hostil a sons mais “progressivos”. Mas dessa alemãozada toda eu curto mesmo são os primeiros discos do Triumvirat. Os melhores são os que têm ratinho na capa.
É muito bom quando você fala de bandas e filmes que nunca ouvi falar na vida. Bora caçar os albuns. Valeu Barcinski.
Ótimo post!!
Devias fazer um artiguinho destrinchando Julina Cope pra plebe ignara. Qual teuCope preferido. O meu é “Jehovahkill”!
Valeu pela dica do livro. O post veio em boa hora. Uma exposicao fotográfica sobre a banda Einstürzende Neubauten e toda a cena cultural da época irá acontecer a partir da semana que vem aqui em Berlim. Todas as bandas mencionadas sao ótimas mesmo. Uma outra banda que pertence ao movimento “Deutschen Neue Welle” dos anos 70 que nao se compara em inovacao estética com as mencionadas no post mas que proporciona um vivo retrato da juventude da esquerda de Berlim Ocidental é a Ton Steine Scherben. Suas letras podem até soar bastante ingênuas para os ouvidos de hoje, contudo sao pura juventude e contestacao. Um verdadeiro grito vindo do bairro proletariado de Kreuzberg – hoje em dia uma espécie de Vila Madalena e Lapa carioca. Os caras eram “a” banda do movimento de ocupacao de casas (Hausbesetzungbewegung), escreveram verdadeiros hinos sobre as questoes políticas mais urgentes da época (algumas vezes a pedido do RAF!). Aumento de tarifa dos ônibus, greve, ocupacao de casas, perspectivas políticas e claro amor. Pelo engajamento deles nas ocupacoes das quais participavam ativamente com concertos e discussoes com os integrantes foram denominados pelos críticos como “Agitrock”. Até hoje a banda é altamente cultuada em Berlim, principalmente o seu vocalista Rio Reiser que é um verdadeiro mito por aqui. Eles estavam no olho do furacao. Berlim com o muro ocupada pelos americanos, franceses, ingleses e russos, uma juventude sem muita perspectiva que rejeitava tanto o comunismo tal qual acontecia na DDR (ditadura) quanto o capitalismo do resto do mundo – um barril de pólvora, época de extremos. As letras da banda refletem todas estas tensoes muito claramente. A discografia é bem irregular contudo eu indicaria dois discos essenciais: Warum geht es mir so dreckig (1971) e “Keine Macht für niemand” (1972). Dê só uma olhada no que o baterista da banda faz em pleno talk show na época contra o capitalismo: http://www.youtube.com/watch?v=sa0rpCgVLs4
É isso aí , viva o krautrock !
Boa lembrança!Einstürzende é outra geração,não menos importante.Junto com a banda inglesa Test Dept e outras formaram o que pode se chamar de rock industrial.Depois de algum tempo bandas de rock pesado incorporaram o termo industrial ao seu estilo.
Ministry,NIN e outras bandas de metal pesado.
Barcinski, nenhum post sobre o Rogério Águas/Turnê The Wall? Se bem que já é notório, vais com toda certeza falar mal, dizer que é caça níquel etc etc. Tudo o que envolve muita $$$ e é bem produzido é ruim.
Além do onipresente Kraftwerk, conhecia apenas as ótimas CAN e Ash Ra Tempel, dicas suas antigas, do tempo da velha BIZZ do início dos anos 90.
Vou atrás das outras bandas.
Thanks!
O Suzuki do CAN, se não me engano, já esteve por aqui pesquisando a música brasileira. Não me lembro de ter lido nada na imprensa brasileira sobre isso.
Agora não há duvida alguma que o Radiohead é resultado direto do som do CAN.
Suzuki quando esteve no Brasil tocou com músicos paulistas, como o Paulo Beto do Anvil FX.
Dica muito boa. Nunca tinha ouvido ouvido falar destes Monks. As discos e cds das demais bandas podem ser encontradas nos sebos das grandes cidades.
Rezando aqui para não vir alguém falar de Jrock. É minha opinião: É chato pra c… e parece tudo música de desenho animado/Jaspion.
Depende do que você ouvir. Ando viciado em Boredoms, vi um show deles semanas atrás com 15 guitarras e 5 baterias e posso falar que foi o show que mais me surpreendeu até hoje.
Entendo quase nada de krautrock, mas gosto muito das bandas de metal/thrash da Alemanha. Será que o pós-guerra foi tão determinante para o surgimento de tantas bandas na Alemanha? Ou será pela posição geográfica?
O país saiu da guerra completamente destruído e humilhado, com todo o peso histórico de ter sido o berço do nazismo, e ainda por cima dividido em Alemanha Oriental e Ocidental, com a primeira alcançando níveis de miséria deploráveis por conta do stalinismo e a segunda se prostrando completamente aos interesses dos EUA. Com certeza esse cenário foi determinante pra aparecerem as bandas de krautrock, a melancolia do período histórico está presente em cada música (o German Oak mesmo se trancou dias num bunker da 2a Guerra pra gravar o primeiro disco)
Será que alguma dessas bandas canta em alemão?
Sim, leia o livro, vale a pena.
Creio que uma música que defina bem a adoração do Devoto pelo Kraut (hehehe) seja “Definitive Gaze”. Tem uns elementos de eletrônica, um “Q” psicodélico, umas guitarrinhas relaxadas (só nela mesmo pois o McGeoch foi um gênio) de fundo e um SENHOR solo de taclado! Uma das melhores músicas que já ouvi.
Sou fanzaço do Can da era Damo Suzuki! pra quem não conhece, recomendo o album Ege Bamyasi, que é o mais acessível deles.
E André, vc curte outros gêneros que são mais desconhecidos como Zeuhl ou RIO?
na lista do Cope sinto falta do primeiro LP do grupo Gila. um disco maravilhoso e que milagrosamente saiu até aqui no Brasil pelo selo BASF.
Puts,essa voce tirou do fundo do bau,Eu tive esse disco.Nem lembrava mais.Só lembro que o selo BASF se caracterizava pela qualidade das capas e do vinil.Tive outros discos do selo,como por exemplo do Don Cherry,um dos cabeças do movimento Free Jazz.
Ta aí um gênero que preciso conhecer melhor. De todas as bandas comentadas, conheço apenas, e gosto muito, do Kraftwerk. Já baixei os PDFs do livro!
O Kraftwerk é bem diferente das outras (menos o Tangerine Dream) pq é, basicamente, uma banda eletrônica, enquanto os outros grupos têm estilos mais variados.
Genial, André. A única coisa que li sobre esse cara foi uma citação em um artigo, há muito tempo, sobre o Ian McCulloch. Vou procurar o livro. Pelo jeito, nem pensar em uma edição brasileira, não é? Valeu a dica. Abs. Paula.
Nem na Europa o livro está em catálogo, imagina aqui…
Nurse With Wound e sua imensa e confusa discografia também mama confessadamente no krautrock.Rock´n´Roll,se alguém achar por aí vale muito a pena pra quem gosta do genero.
Nossa, melhor post do ano. Krautrock é a trilha sonora perfeita do pós-guerra. Pra quem quiser conhecer mais também, isso aqui ajuda:
http://www.progarchives.com/subgenre.asp?style=17
Eles não são dessa onda experimental nem nada, mas já ouviu Die Toten Hosen? É uma pira meio punk, a banda é muito boa. E tem o Auletta, q é mais novo, lembra um pouco Strokes. Recomendo também.
Falando de Krautrock, Zappa ??!!!!