Todo cinéfilo deve muito a este sujeito
22/06/12 07:05
Você gosta de cinema? Tem seus diretores preferidos? Gosta de discutir o estilo e influência de cada diretor?
Então você deve muito a Andrew Sarris.
Sarris, um dos mais polêmicos e importantes críticos de cinema norte-americanos, morreu quarta-feira em Nova York, aos 83 anos, de um vírus estomacal. Era casado com a também crítica de cinema Molly Haskell.
Ele foi o maior defensor da “teoria do autor” no cinema. Em 1962, Sarris publicou no jornal norte-americano “The Village Voice” um artigo chamado “Notas sobre a teoria do autor”, em que defendia a idéia de que o diretor seria o verdadeiro “autor” de um filme.
Se hoje isso parece óbvio, naquela época foi considerado por muitos um absurdo.
O cinema era dominado pela figura do produtor, que era o verdadeiro “dono” de um filme (não é à toa que o produtor recebe o Oscar de “melhor filme”). O diretor era quase um coadjuvante, uma figura sem moral e que só obedecia a ordens.
O cinema, em geral, não era visto como grande arte, mas como entretenimento de massa.
No fim dos anos 50, Sarris passou um tempo em Paris, onde conviveu com cineastas da Nouvelle Vague e críticos da revista “Cahiers du Cinema”, como François Truffaut , Jean-Luc Godard e Claude Chabrol.
Foi a turma da Nouvelle Vague que começou a tratar o cinema com a deferência que merecia. Cineastas como John Ford, Nicholas Ray, Howard Hawks e Hitchcock, até então considerados competentes peões na linha de montagem de Hollywood, ganharam status de gênios.
Inspirado pelos franceses, Sarris voltou aos Estados Unidos disposto a divulgar suas idéias. Mas elas não foram tão bem recebidas.
A famosa adversária de Sarris foi a grande crítica Pauline Kael. Em 1963, antes mesmo de entrar para a revista “The New Yorker”, Kael escreveu um artigo furioso, desancando Sarris e suas idéias sobre o “cinema de autor”.
Kael via o cinema mais como um empreendimento colaborativo e zombava dos “devaneios” de Sarris.
Os dois tornaram-se inimigos e passaram a brigar por meio de suas respectivas publicações. Foi uma época de ouro da crítica de cinema nos Estados Unidos, quando cinéfilos se dividiam entre defensores de Sarris e de Kael.
Mesmo quem não concordava com as idéias de Sarris não podia negar sua importância.
Seus textos sobre cinema europeu e asiático no “Village Voice” ajudaram gerações de cinéfilos a descobrir Ingmar Bergman, Michelangelo Antonioni e Akira Kurosawa. Seu fascínio pela “Nouvelle Vague” popularizou Godard e Truffaut.
Sarris também teve grande importância na valorização de cineastas norte-americanos como John Ford, Howard Hawks e Orson Welles, e ajudou a acabar com a barreira que existia entre “cinema de arte” e “cinema comercial”. Para ele, só existia “cinema bom”.
Em 1967, Sarris escreveu: “Hoje, é possível falar de Hitchcock e Antonioni na mesma frase e com a mesma terminologia crítica.”
Sarris foi também um dos primeiros críticos a fazer listas de melhores filmes do ano, prática hoje corriqueira (veja aqui todas as listas que Sarris publicou entre 1958 e 2006).
E torço para que termine logo essa semana maldita, em que se foram Carlos Reichenbach e Andrew Sarris.
Barça, 30 anos do primeiro disco do Barão Vermelho e da Blitz, não vale uma menção (leia-se post gigante com 300 comentários)? Lembre-se do que disse o Dapieve em seu livro, era uma época em que ouvíamos hits de gente como Oswaldo Montenegro cantando “Agonia”, de Mongol.
Fiquei curioso com a lista de Sarris. É tudo muito relativo, óbvio, mas de modo algum Tootsie e Vitor ou Vitória são melhores que Blade Runner (1982)
Nas listas do Sarris senti falta de VELVET BLUE, Divid Linch, feito nos anos 80, para mim um dos melhores filmes de todos os tempos.
André, agora posso falar sem medo de ser apedrejado que gosto de “Susie e os Baker Boys” do Steve Kloves já que tá na lista do melhores de 1989 do Andrew Sarris. Outra coisa, você acha que o Brasil da o mesmo valor que Estados Unidos e Europa dão para os críticos culturais?
Eu tb gosto muito deste filme.
Temos de dar mais importância para o cinema no Brazil.
Assim as nossas casas de espetáculos ficarão cheias.
Fala André, tudo bem?
Ha tempos acompanho seu blog, sempre encontrando posts, comentários e críticas muito interessantes sobre cinema, música, etc.
São temas, autores e músicos que também aprecio muito, e além disso, que muitas vezes divulgo e comento também em meu blog pessoal.
Caso tenha algum tempo livre aí, e interesse em conhecer, claro, o endereço deste blog é http://www.cafecult.com.br.
De qualquer forma, parabéns pela “confraria”.
Abraços,
Fabrício
Valeu, vou checar com certeza.
Só acho que a figura do produtor é tão importante quanto a do diretor. Muitas “possibilidades” do filme são sugeridas e aplicadas pelo produtor em detrimento a ídeias “mirabolantes” do diretor que são inviáveis financeiramente…só o diretor leva as glórias do filme: injustiça com montadores, diretores de arte, etc
Barcinski, podia rolar um Garagem só com trilhas de cinema, heim velho?
O blog segue sensacional, parabéns.
Valeu!
André, o que você acha de O Poderoso Chefão III estar na lista dele de 1990 e as partes I e II não estarem em nenhuma lista? Acho no mínimo curioso. Ele não deve ser grande fã do Coppola. Gostaria de ler sua opinião. Abraço!
Acho um absurdo, eu poria os dois primeiros e não o terceiro. Mas quem sou eu pra brigar com o Sarris?
Não acho que ele necessariamente prefira a parte III às duas primeiras. A lista só mostra que 1990 foi um ano triste para o cinema: em 1972 e 1974 havia muito mais opções de bons filmes para um ranking desse tipo.
E, pelo visto, ele não gostou tanto assim de “Cidade de Deus”…
No esquema de produção industrial de Hollywood, o produtor continua sendo o dono indiscutível do filme. O depoimento do Walter Salles, quando fez aquele filme Água Negra, se não me engano, e mais recentemente do Heitor Dhalia não deixam dúvidas, eles não tinham direito nem a cafezinho sem pedir ao produtor.
Nem me lembre desse filme. O resultado é abomivável, mas pelo menos mostra um lugar menos glamuroso de Nova York! O pior é que ele não pode dizer que precisava de grana! (nem seu filho, nem seu neto, nem seu bisneto…)
Pelo menos sobrou o Roger Ebert, que eu pessoalmente gosto muito. E sem puxa-saquismo do Barcinski, que faz listas muito legais. A de documentários assisti quase todos, só faltou Grey Gardens que não achei na época.
Também gosto muito do Ebert. Que, aliás, fez um texto muito bonito sobre o Sarris, procura que vc vai curtir.
Legal vou atrás.
Caraca…Na lista de 1985 ele lembrou do “To Live and Die in L.A.”…Tinha me esquecido deste filme, só vi uma vez nos tempos áureos do Super Cine.
Já escrevei sobre esse filme no blog.
Gosto das idéias dele. Mas achar “Shampoo” melhor que “Barry Lyndon” em 1975 é triste. Apesar da canastrice de Ryan O`Neal, Barry Lyndon é um dos filmes mais brilhantes jamais feitos. Pauline Kael, que não gostava do Kubrick, disse: “é uma obra prima em cada fotograma”.
Anotei vários filmes da lista dele para assistir. Mas notei uma curiosidade: O Poderoso Chefão I e II não estão na lista. Mas a parte III está. Como assim? Será que ele fez isso só de birra? Os dois primeiros filmes da série não podem ficar fora da lista dos melhores filmes dos anos 70. Já o terceiro, o mais fraco de todos, está no top 10 de 1990. No mínimo curioso
Nossa! Vendo essas listinhas noto como era difícil se ater a apenas dez filmes entre os melhores de cada ano.
André.Como você bem frisou, listas são sempre polêmicas etc, etc…Mas esquecer Scorsese e Coppola durante a década de 70 é absurdo!
Tá bom, esqueci que uma década só acaba a partir do número 01. Então dei uma nova checada e notei que tá lá “Touro Indomável” na 18ª colocação.
Não gosto muito deste papo de cinema de autor, mas não há como negar a validade do conceito (vide Woody Allen, Tarkovsky, Tarantino etc.). Só acho que o papel do produtor é subestimado. Penso que ele é um dos grandes responsáveis por fazer um filme acontecer (para o bem e para o mal). Não vejo pessoa mais adequada para receber um prêmio de melhor filme.
Depende. Alguém lembra quem produziu “Acossado”?
Depende mesmo. Para meus pais “E o vento levou…” é um filme “da Metro”.
Sim, por isso mesmo. O cinema americano é muito mais associado aos produtores e aos estúdios que o europeu, de uma forma geral.
É verdade. A Pixar é um exemplo recente. As pessoas dizem gostar dos filmes do estúdio, da produtora.
Na verdade “E o vento levou” só não é um filme da Metro porque a MGM só distribuiu o filme. Trata-se, na verdade, um filme de David O. Selznick, o produtor (assim como “Rebecca”, que é muito mais Selznick do que Hitchcock). Victor Fleming, segundo o próprio Serris, nunca foi um autor. (E boa parte do filme, aliás, foi dirigido pelo George Cuckor.) “O mágico de Oz”, o outro filme famoso do currículo de Fleming, é, esse sim, um filme da Metro.
Grato por detalhar as informações, J. Mas você entendeu o que eu quis dizer, né…? Entre as chamadas “A Selznick Internacional Picture” e “Metro-Goldwyn-Mayer release”, os velhos ficaram com a última informação, que lhes era mais familiar. Eu queria dizer que produtores como Irving Thalberg e David Selznick são autores (principalmente Thalberg, uma figura fascinante como disse Scott Fitzgerald).
Sim, claro! E o que eu quis dizer foi que seus pais estavam certos — “E o vento levou” é um filme de produtor –, só erraram o estúdio.
Por outro lado, duvido que “Intriga Internacional” seja para seus pais um filme da Metro em vez de um filme de Hitchcock!
Como o assunto de hoje passa pelo cinema, ontem acabei de ver o pior filme de todos os tempos: Flores do Oriente. Esse diretor é um John Woo que acha que faz filme de arte. A atuação do Cristian Bale é de uma vergonha alheia imensa. Também dei várias risadas no filme, que é de uma sensibilidade e delicadeza de um Vin Diesel. Como eu sei que você agora está tendo que comentar os filmes para o Guia da Folha… Meus pêsames se for ter que assistir esse.
Acho Cristian Bale um canastraço. Não vi essa belezinha ainda…
Caramba!! O Sarris colocou A.I. Inteligência Artificial como filme do ano!!! Aí forçou muito a amizade: era o “meu pior filme de todos os tempos” até assistir ao “Flores do Oriente”.
Adoro listas por causa disso.
Sério, Barcinski? “O Vencedor” em que ele faz papel de um ex-pugilista viciado em crack, você também não gostou?
Abraço
Gostei do filme, acho que ele está bem nesse papel porque faz um cara histriônico e que é bem a cara dele. Em Inimigos Públicos, por exemplo, ele quase estraga o filme.
Ele tá se tornando o sucessor do Nicolas Cage.
Tem que tomar muito Toddy pra ser tão ruim quanto o Cage.
Também achei Flores do Oriente o pior de Zhang Yimou. E que bom que não sou o único a não gostar de Cristian Bale.
hahaha. Flores do Oriente eh um dos piorea filmes de todos os tempos mesmo.
Agora, AI acho bem legal… abs
Interessante que na lista de 1994 ele coloca o aclamado “ Pulp Fiction “ em 11º na lista, enquanto que “ Heavenly Creatures “, que eu particularmente adoro em 2º , muito interessante as listas, um painel bem eclético.
Barcinski, já que tocaram no assunto, o que você achou do Pulp Fiction logo que saiu? Lembra da sua primeira reação?
Lembro. Na época adorei, achei uma novidade e muito criativo. Mas fui diminuindo meu entusiasmo com seguidas revisões…
Chegou a publicar alguma resenha/crítica a respeito, Barcinski? Se tiver algum link fico muito grato.
Sobre Pulp Fiction? Não me lembro, acho que não.
Luigi, não sou o Barcinsli longe disso, mas posso te dizer que teve um impacto grande esse filme do Tarantino principalmente a trilha sonora, que alias eu ainda tenho o cd, mas como bem o Barça disse com o tempo o tesão foi acabando, hoje com o distanciamento acho um bom filme, e em retrospecto prefiro o subestimado ” Jackie Brown”
Valeu pelo retorno, Paulo! Já viram a teoria de que todos os filmes do Tarantino são na verdade um só? http://www.youtube.com/watch?v=Fknp2aDXQyU
No livro “Como a Geração Sexo, Drogas e Rock’n’Roll Salvou Holywood’ fala que muitos diretores tinha verdadeira adoração pelos cineastas europeus, especialmente pelos Nouvelle Vague.
Além do que tem passagens sensacionais dobre os bastidores de sets, estúdios e vidas dos diretores e atores.
Já recomendei muito esse livro aqui no blog, é imperdível.
André, o interessante na lista dele é que tina espaço para todo tipo de cinema: o “de arte”, o “comercial”, o bom e até uns não tão bons assim.
E o mistério que morreu com ele: pq dos Chefões ele só incluiu o terceiro, o mais fraco da trilogia?????
Listas são pessoais e nunca agradam a todos. Tb acho estranho ele não incluir os dois primeiros, mas vai saber o que ele achou?
Barcinski, a Pauline Kael parece ter se rendido, pelo menos um pouco, à teoria do autor na década de 70 com o surgimento dos novos cineastas (Coppola e cia), ou estou enganado? E o Sarris deve ter se deleitado com o sucesso dos “filmes de diretor” dessa época! Abraço!
Na verdade, os dois foram grandes defensores dessa geração dos anos 70, mas a Kael nunca deixou de alfinetar o Sarris, e vice-versa. A Kael parecia enxergar o cinema de uma forma mais pragmática, como um “produto” – ela chegou a trabalhar para estúdios – enquanto o Sarris trazia uma visão mais romântica, herdada dos franceses.
Também achava que a Kale defendia a teoria do autor, não sabia dessa richa com o Sarris.
Sério que na lista dele dos top 10 do ano de 1995 colocou o filme “Clueless” ?…Meu Deus!!
Costumo execrar esse tipo de filme, mas concordo que Clueless é bastante acima da média.
Olha, acho que o Sarris neste caso, deve ter se apaixonado pela Alicia Silverstone, por isso está entre os 10, mas perto do cinema pipoca atual, tb acho “As Patricinhas…” acima da média, pelo menos tem uma história….
Barcinski, algum livro sobre Sarris publicado no Brasil? Ao menos uma compilação de textos ou algo do tipo?
Forte abraço!
Vou ficar te devendo, só tenho os originais. Dá uma olhada em http://www.estantevirtual.com.br, se existir, lá tem.
Não sabia desse cara. Conhecia só a Pauline e a turma de Paris.
Pelas listas dele, dá pra ver que ele de fato ajudou a popularizar os Europeus nos Estados Unidos.
Agora, é interessante ver que o único Poderoso Chefão que ele coloca em suas listas é o 3.
E eu que julgava entender alguma coisa de cinema…
Eu não sabia nada sobre Sarris!
Obrigado pelo texto!!!!
Barcinski, eu posso estar enganado, mas tenho a impressão que o feminino de “crítico” é “criticista”, e não “crítica” como você usou.
Olha, alguns dicionários dizem para usar “crítico” mesmo, mas dê uma busca, todas as reportagens e artigos sobre a Kael que achei em português a chamam de “crítica”.
Localizei “criticista” como “partidário(s) do criticismo”, sendo este “s. m.
Racionalismo que procura determinar os limites da razão humana”. Como crítica aparece também como “feminino de crítico”, apesar da ambiguidade acho que ainda é o melhor termo. Por outro lado, achei como “que ou quem faz crítica” o termo “criticador(a)”(?!).
Barcinski, enquanto os grandes se vão, os boçais ditam as regras… Aproveitando a lembrança da perda recente do Carlão Reichenbach, o MIS-SP exibe hoje, sexta-feira, três filmaços dele. Dois Córregos, Lilian M, e Alma Corsária. às 16h, 18h e 20h, respectivamente. É melhor ainda: de graça!!! Vale (muito) conferir essa!! Abraço
Vale sim, especialmente Lilian M, que acho demais e é raramente exibido.
O post me fez lembrar de uma entrevista com o ator/diretor Juca de Oliveira. Quando perguntado sobre onde os diferentes “locais de trabalho” para um artista ele, sinteticamente, respondeu: “o cinema é a arte do diretor, o teatro a arte do ator e a televisão a arte do anunciante”. Achei brilhante!
Muito boa definição.
Essa frase não é do Paulo Autran??