Rio-Santos à espera do Apocalipse
14/03/13 07:05Sou a favor de uma lei que obrigue todos os governantes e funcionários públicos a utilizar somente os serviços pelos quais são responsáveis, sejam hospitais, escolas ou transporte público.
Um bom começo seria exigir que o diretor do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), responsável pela manutenção da Rodovia Rio-Santos, seja obrigado a percorrer a estrada todo dia, especialmente no trecho entre Paraty e Rio de Janeiro.
Leio na web que a Rio-Santos foi “entregue” em 1973, mas nunca foi oficialmente inaugurada. Agora entendi: ela nunca foi terminada.
Quando se fala em Rio-Santos, é preciso fazer uma distinção importante: o trecho dentro do território de São Paulo é uma estrada. Tem seus problemas: uns buracos aqui, sinalização ruim acolá, mas é uma estrada. Assim que a Rio-Santos ultrapassa a fronteira do Rio de Janeiro, no entanto, vira um acesso ao inferno, uma visão pós-apocalíptica digna de um filme de Roland Emmerich.
Fico à vontade para opinar, já que moro no estado do Rio de Janeiro, pago meus impostos ao governo do Rio, e sou usuário sofredor da Rio-Santos há muitos anos.
Cada vez que penso que a Rio-Santos é a principal via de fuga em caso de um acidente nuclear na usina de Angra, lembro que preciso matricular meus filhos na natação, já que a maneira mais rápida de escapar da radiação será a nado.
Dia desses, ficamos parados por mais de uma hora em três barreiras na estrada. Duas das paradas ocorreram em locais de obras “emergenciais”, nos mesmos locais onde já fiquei parado incontáveis vezes desde os anos 80.
O mais curioso é que essas interrupções na estrada se concentram depois da fronteira com o Rio. Quem sabe São Pedro não tem um acordo com o governo de São Paulo, para só derrubar barreiras e abrir crateras dentro do território fluminense?
Agora, uma coisa não dá para negar: o DNIT e o governo têm senso de humor.
Quer prova? Que tal o posto da polícia rodoviária em Mambucaba, que está desabitado há mais de dois anos? Veja bem: ele não está desativado, mas desabitado. Porque o posto está lá, limpinho e até bem iluminado à noite, mas nunca tem ninguém. Deve haver alguma câmera por ali, registrando a cara de espanto dos motoristas que param para pedir ajuda.
Outro dia, minha mulher, que estava grávida e dirigindo sozinha, parou lá por causa de um pneu furado. Foi pedir ajuda no posto e deu de cara com o lugar vazio. Acabou socorrida por um valoroso bombeiro, que passava no local.
O que dizer das placas na Rio-Santos? Algumas são hilariantes. Minha favorita é “Cuidado: trecho com alto índice de acidentes”, que poderia ser traduzida por “Essa curva foi projetada por um energúmeno e mantida por outros piores ainda, que não se deram ao trabalho, em 40 anos, de consertá-la”. Achar a placa é fácil: é só procurar a carcaça de um carro fumegante, sempre ali por perto.
Dou muita risada também com a placa que mostra pedras caindo de uma ribanceira, e que significa “Neste local, pedras caem na sua cabeça há 40 anos e vão continuar caindo”.
As brincadeiras continuam na região de Itaguaí, onde o povo tem o hábito de cruzar a rodovia de bicicleta, com um filho de cinco anos sentado no guidom. E detalhe: sempre passando debaixo da passarela, para aproveitar a sombra, que ninguém é de ferro.
P.S.: estarei fora hoje e amanhã e impossibilitado de moderar comentários, pelo menos até à noite. O blog volta na segunda-feira. Bom fim de semana a todos.
Pelas últimas notícias a parte competente à São Paulo da Rio-Santos acaba de ruir. Não é só privilégio carioca não. É o Brasil amigo.
Pegando um gancho no comentário do Mesquita sobre as passarelas, pergunto: por que não acabar com essas inutilidades especialmente as localizadas dentro das cidades?
Em São Paulo existem algumas que são verdadeiros monstrengos.
Caro André, sou seu fã a long time, desde o saudoso GARAGEM, mas ousarei discordar. Sou paulistano e conheço bem a Rio-Santos e vou com alguma frequencia à Paraty, há um ano atrás cheguei a me hospedar em uma casa vizinha a sua. Considero o único trecho razoável da Rio-Santos o que vai de Ubatuba à Paraty, o resto é vergonhoso. O trecho que liga Caraguatatuba à Ubatuba se tornou uma imensa avenida por causa da intensa ganância imobiliária que loteou todos os terrenos limítrofes à estrada. Ridículo! é lombada atrás de lombada. Esta semana fui a Camburi em São Sebastião e a estrada estava interditada por quedas de barreira, a Moji-Bertioga também. Esta história de endeusar São Paulo é uma tremenda bobagem, e a quilometragem feita no percurso Paraty-Rio é mais rápida e com os mesmos problemas de São Paulo. Quanto as passarelas, como arquiteto sou absolutamente contra, entendo que são sacanas com os pedestres e só favorecem os automóveis dos mais ricos, mas este é um assunto que mereceria um debate maior. Percebo que está puto, mas compreendo, e eu como paulistano continuo invejando o Rio. Um grande abraço de um velho roqueiro.
Mesquita, se você quiser saber como NÃO se deve fazer um auto estrada, faça uma viagem de 40 km pela Raposo Tavares, de São Paulo a Vargem Grande.
Até o final dos anos 90 A Raposo era uma rodovia modesta de pista simples, passando por dentro de Cotia e Vargem Grande. Mas o aumento do fluxo de carros exigiu a duplicação da pista. O ‘progresso’ reclamava espaço para os automóveis.
E foi o que a concessionária fez. Duas pistas com três faixas cada, asfalto impecável, uma beleza. Cercada pelos inexpugnáveis muros de concreto de modo a impedir a passagem de pedestres e animais, a nova Raposo é hoje um autêntico muro de Berlim dividindo Cotia em duas cidades.
É um obstáculo intransponível.
Mas, e os pedestres, as pessoas, os seres humanos que só fazem atrapalhar um bom projeto de engenharia? Bom, como é de praxe, foram brindados com as horrendas passarelas acessadas por intermináveis escadas. Imagine um idoso, um deficiente físico ou uma mulher com criançass e sacolas nas mãos subindo e descendo escadas!
O governo de São Paulo já anuncia obras de ampliação do porto de São Sebastião e construção de mais faixas para automóveis e caminhões na Tamoios. Não vai demorar muito e o ‘progresso’ também chegará ao litoral norte de SP.
Só nos resta rezar.
abraço
Esse trecho é federal ou estadual? Pergunto: o que o governo fluminense faz com os tais bilhões que arrecada com os royalties da extração do petróleo e que está as gritas com a iminência de perdê-los?
André, pincei este (atualíssimo) trecho do livro O Espetáculo Mais Triste da Terra_O Incêndio do Gran Circo Norte-Americano, do Mauro Ventura: “Do ponto de vista da prevenção de acidentes, o Brasil inteiro é um grande circo…Este é o país dos aeroportos-armadilhas. O país em que raras são as casas de espetáculo que atendem aos requisitos básicos de proteção ao público. O país em que os transportes são ratoeiras; as ruas, arapucas; e as estradas, mundéus. O país em que, somente por sorte, ou melhor, compaixão de Deus, não ocorrem diariamente episódios tão terríveis quanto o de domingo à tarde em Niterói”. Trata-se de um editorial do Jornal do Brasil, de 19/12/1961…
Se alguém morrer ali, não vai por falta de aviso. Impossível o recado ser mais claro.
André, é catártico quando alguém escreve algo pelo qual já passamos. Fui com minha esposa até Angra em 2011 e, sim, a estrada deixa de sê-la quando passamos pela divisa entre SP e Rio. Não passei por toda a Paraty, mas os caminhos de Angra são terríveis, com estradas muito mal cuidadas e mal sinalizadas, a ponto do pórtico de recepção da cidade estar abaixo do nível da Rio-Santos com placas sem reflexibilidade com a luz dos faróis. Um terror. Nenhum cidadão digno merece ter o respaldo público que temos. Além disso, você tem toda razão: representantes do poder público só poderiam usar serviços públicos. Estão aí tantos políticos nordestinos que se tratam nos melhores hospitais de São Paulo. Quem paga a conta? Grande pauta para filhos da pauta.
Abraço!
Todos os políticos se tratam em hospitais privados, não só os nordestinos.
“Estão aí tantos políticos nordestinos que se tratam nos melhores hospitais de São Paulo.”
Sem noção!! Boa resposta Barça!
Desculpem-me, mas acho que vocês não entenderam o contraponto. Não é uma questão do estado em si, mas das verbas recebidas, há décadas, por grandes coronéis nordestinos e da absoluta ineficiência do atendimento público. Sim, políticos paulistas também se tratam aqui. A questão é a duradoura e permanente incompetência de todos eles. Lamento a má interpretação, sobretudo em tempos do politicamente correto.