Então esta é a tal “liberdade de informação”?
22/04/13 07:05Semana passada indiquei aqui no blog o livro “The Soundtrack of My Life”, autobiografia de Clive Davis, um dos executivos mais influentes e polêmicos da música pop.
Um dos primeiros comentários que recebi, poucos minutos depois de o texto ser publicado, trazia um link para que todos pudessem baixar o livro sem pagar.
Esta ideia de que tudo é de graça já encheu a paciência. Será que as pessoas têm tanto desprezo por livros que se acham no direito divino de usufruir deles sem pagar?
Escrever sobre esse tema é mexer em vespeiro. Já sei os tipos de comentários que receberei. Boa parte será ao estilo “Robin Hood de laptop”, defendendo a “liberdade de informação” e tachando de “reacionário” qualquer um que tenha opinião diferente.
Outra parte usará o método de intimidação mais comum nas redes sociais, a desqualificação do debatedor: “Olha quem está falando, até parece que ele não baixa nada da Internet…”
Para início de conversa: baixo, sim, muita coisa de graça da Internet. Mas tento usar o bom senso: baixo filmes que não estão disponíveis no Brasil (especialmente documentários, cada vez mais raros por aqui) e discos de bandas novas que me interessam. E se gosto das bandas, geralmente compro o disco. Posso dizer que nunca comprei tantos discos, filmes e livros e assinei tantas revistas e jornais quanto nos últimos anos.
Já prevejo a réplica: “Quero ver se você liberaria um livro seu…”
Respondo: liberaria sim, dependendo das circunstâncias. Há alguns meses, um leitor escreveu dizendo que não estava encontrando meu livro “Barulho”, que publiquei em 1992. Outro leitor disse que tinha o livro em pdf e perguntou se poderia disponibilizá-lo na rede. Ora, o livro está fora de catálogo e a editora que o publicou nem existe mais. Por que diabos eu seria contra liberá-lo de graça, se isso não vai acarretar prejuízos para a editora que me contratou? Claro que liberei.
Espero receber também vários comentários furibundos me acusando de ser contra a “democratização” da Internet. A esses reclamantes, adianto: acho perfeitamente possível respeitar o direito autoral e defender o direito de todos a uma Internet acessível e de qualidade. Não são coisas excludentes.
Acho que o autor deve ser livre para decidir como sua obra, seja livro, disco, artigo ou filme, é veiculada. O Radiohead quer vender um CD no esquema “pague quanto acha que vale”? Ótimo. Uma banda quer disponibilizar todos seus discos de graça? Ótimo também.
Vale lembrar que na época em que existia indústria do disco, artistas faziam shows para vender discos, e hoje fazem discos para vender shows. O que explica, em parte, a inflação no preço de shows nos últimos 10 ou 15 anos.
O problema é que nos acostumamos à ideia de que ideias não valem nada. Pagar para ler qualquer coisa é considerado “injusto”. Mas na hora em que alguém explode duas bombas em Boston, onde buscamos informação? No blog de um desses Robin Hoods virtuais ou na CNN?
No documentário “Page One”, sobre o jornal “The New York Times”, há uma cena marcante: David Carr, colunista do jornal, participa de um debate sobre a crise no jornalismo. Um dos debatedores defende a tese de que jornais são “obsoletos” porque todas as informações podem ser encontradas em sites de busca. Para provar, exibe uma folha impressa com a página principal de um desses sites, que traz dezenas de notícias.
Carr pede um intervalo de alguns minutos para continuar o debate. Quando a conversa é reiniciada, ele mostra a mesma folha impressa com a “homepage” do site de notícias, inteiramente recortada e sem conteúdo algum. “Cortei todas as reportagens que foram tiradas de jornais ‘obsoletos’. Como se vê, não sobra muita coisa.”
Para resumir: “agregar” conteúdo é diferente de “produzir” conteúdo.
Em janeiro, o franco-norte-americano André Schiffrin foi ao programa “Roda Viva”, da TV Cultura. Schiffrin é chefe da The New Press, uma editora sem fins lucrativos e mantida por fundações, que publica livros de qualidade que não encontram espaço num mercado que privilegia “best-sellers”.
Na entrevista, Schiffrin falou das propostas que existem para que sites de buscas, como o Google, comecem a pagar pelo uso de conteúdo. Na Alemanha, o governo aprovou uma lei que permite a editoras cobrarem de sites de buscas e outros “agregadores online” (leia mais aqui). O Google, claro, é contra, e começou uma campanha chamada “Defenda Sua Internet”, dizendo que a lei “vai dificultar o fluxo livre de informações”. Só para lembrar: o Google vale 250 bilhões de dólares. Não é uma ONG.
Enquanto legisladores e o Google não chegam a um acordo, os Robin Hoods continuam a roubar dos ricos para dar aos mais ricos ainda. No caso do Brasil, com um agravante: frequentemente usam dinheiro público para organizar debates e eventos para defender que tudo seja de graça. O que está errado nesta equação?
Não baixo livros pois acho um saco ler no computador. Baixo muita música de graça por que os preços dos CDs são extorsivos e além disso algumas coisas estão fora de catálogo. Das minhas bandas preferidas eu acabo sempre comprando o CD mesmo, pelo fato de tê-lo na coleção. E quando encontro uma banda legal cujo CD custe entre R$ 15 e R$ 20, eu compro, pois é o preço que eu posso pagar. Às vezes eu baixo música pelo iTunes, que acaba custando menos do que um CD nacional.
Não sei se é certo ou errado baixar de graça! Sei que as coisas mudaram com a internet. O download gratuito acaba sendo a versão nova das antigas fitas K-7’s.
De qualquer forma, acho válido se discutir este assunto.
Barça agora que a Folha nos informa que meros mortais não assinantes só podem ler 20 artigos da empresa por mês, vai permitir que façamos uma cópia pirata do seu blog.
Que tal investir 80 centavos por dia e assinar? Garanto que não vai te matar.
Andre, eu gostaria de comprar a biografia do Sepultura, se vc tiver algum exemplar ainda. Na impossibilidade disso, eu pagaria por um pdf, pode ser?
abraço do Manoel
Olha, om livro será reeditado muito em breve.
Excelente notícia!!
Não quero ser dono da verdade nem me arvorar de argumentos pra defender isso ou aquilo.
Só sei que o mundo mudou.
Os fabricantes de carruagens devem ter se revoltado no início do seculo XX contra os primeiros automóveis.
Os operadores de telex (alguém lembra do telex?) com certeza não gostaram nem um pouco quando ouviram falar do fax.
Hoje quem produz mídia e cultura fica apavorado com a internet e a possibilidade quase infinita de piratearem suas obras.
Mas acho que gritam em vão, o mundo não vai voltar atrás, a internet não vai desaparecer e quem quiser disponibilizar um CD ou um livro na rede vai acabar fazendo, gostem ou não.
Não tem volta.
Primeiro jornalista que vejo que coloca o prejuízo da pirataria na produção musical no mesmo patamar da produção jornalística – e intelectual, de maneira geral.
Até então apenas tive contato com jornalistas empenhadíssimos em “instituir” a distribuição musical gratuita e defendendo a ferro e fogo seus próprios interesses, como se não fizessem parte de um todo.
No meu caso, especificamente, tenho apenas a lamentar que o louvor à alienação e ignorância por parte dos próprios músicos tenham levado à extinção da profissão.
Que vocês, jornalistas, tenham melhor sorte no decorrer do tempo.