O torcedor e a Revolta das Caxirolas
01/05/13 07:05Estamos às vésperas da Copa das Confederações e a pouco mais de um ano da Copa do Mundo. Em qualquer país, o povo estaria respirando futebol.
Nas ruas, ninguém falaria de outra coisa. Crianças passeariam de camisa da seleção. Todo jogo seria uma festa, com estádios cheios e torcida animada.
Mas não é o que ocorre. Na verdade, não lembro uma época em que o futebol brasileiro estivesse tão por baixo quanto agora.
Nossa seleção é execrada. Aliás, a seleção não é “nossa”, mas da CBF, como bem disse Ricardo Teixeira. O povo não se identifica com o time da CBF e vaia o time.
Nossos campeonatos estaduais foram sabotados pelas federações, que se perpetuam no poder à custa de favores aos times menores.
Nossos estádios, com poucas exceções, vivem vazios. Facções organizadas de torcedores profissionais dominam as arquibancadas.
Não podemos fumar, beber álcool ou levar bandeiras aos estádios. Não temos jogos de duas torcidas porque a polícia não tem competência para garantir a segurança. Partidas noturnas começam em horário de boate para satisfazer a TV. Enquanto isso, na “sisuda” Alemanha, quem paga ingresso pode fumar, beber e exibir bandeiras.
Nosso Ministro do Esporte vai ao programa de TV “Roda Viva” e não tem capacidade de responder com clareza a uma pergunta sequer sobre os problemas da Copa do Mundo, preferindo acusar os jornalistas de “adversários da Copa” e ressuscitando a filosofia militarista do “Ame-ou ou deixe-o”.
O primeiro jogo no Maracanã depois de uma reforma que custou quase 1 bilhão aos cofres públicos é uma pelada entre amigos de Ronaldo e amigos de Bebeto. Dizem que é um “jogo-treino”, mas o evento é transmitido pela TV e usado de propaganda por Dilma, Lula, Sergio Cabral e Eduardo Paes, o que o torna um evento oficial. Mesmo assim, Ronaldo acha por bem usar o Maracanã de playground e coloca um parente da esposa para jogar, enquanto Zico, Romário, Dinamite e tantos outros ídolos da história do Maracanã não foram convidados.
O apresentador da inauguração do novo Maracanã não foi José Carlos Araújo ou algum narrador esportivo com vínculos antigos ao estádio, mas Luciano Huck. Repito: Luciano Huck.
Nossos times, com poucas exceções, estão falidos, com dívidas impagáveis e divisões de bases dominadas por empresários.
Nossa imprensa esportiva se divide entre o oba-oba oficialesco e aqueles que insistem em dizer a verdade e são tachados de “pessimistas”.
O homem mais poderoso do futebol brasileiro é uma relíquia da ditadura que não pode nem chegar perto da presidente da República.
A FIFA manda e desmanda por aqui. Diz que “Mané Garrincha” não pode batizar o estádio em Brasília e que a cerveja estará liberada apenas durante a Copa. Depois da Copa, nós voltaremos a ser tratados como crianças e não poderemos tomar cerveja durante o jogo.
Para completar, temos a tal caxirola, uma invenção oportunista e com carimbo estatal, que o músico Carlinhos Brown quer nos empurrar goela abaixo – por módicos R$ 29,90 – como um apetrecho indispensável ao fervor nacionalista que deve reinar durante a Copa.
Ninguém pode ser a favor de torcedores jogarem objetos no campo. Isso é errado. Mas a Revolta das Caxirolas, como já ficou conhecida a chuva de chocalhos promovida pela torcida do Bahia, dá uma ideia da reação que se pode esperar do povão. Ninguém é idiota. As pessoas percebem quando uma iniciativa é puramente marqueteira. E não é todo mundo que se presta a servir de claque para esse espetáculo grotesco que virou o futebol brasileiro.
Tanto os mineiros que, no jogo Brasil x Chile, gritaram “olé” para humilhar o time da CBF, quanto os baianos que demonstraram as qualidades aerodinâmicas da caxirola, estão apenas descontando – com diferentes graus de civilidade – o que a CBF, as federações, os clubes, o governo e grande parte da mídia fizeram com o nosso futebol.
Alguns dizem que a Copa do Mundo será a “reviravolta” que todos esperamos para o futebol brasileiro. Do jeito que as coisas vão, a Copa parece mais um obstáculo ao desenvolvimento do esporte. Terminaremos a Copa com estádios superfaturados (alguns abandonados), com uma divisão ainda mais gritante entre times grandes e menores, com empresas particulares beneficiadas por contratos açucarados de exploração de estádios bancados com dinheiro público, e com ingressos mais caros para espantar o povão. E aí, periga não ter volta. Nem o Maracanã, Mineirão e Fonte nova teremos mais para recordar. Como chegamos a isso?
P.S.: Estarei sem acesso à Internet até o meio da tarde e, portanto, impossibilitado de moderar os comentários. Se o seu comentário demorar a ser publicado, por favor não me xingue ou reclame de censura. Obrigado.
Lula conta uma piada sobre a Copa de 2014
http://youtu.be/WP0V6G-Cjtk
De algum tempo que vejo claramente em nosso país o cidadão ser tratado como criança! Não pode isto, não pode aquilo, não pode aquele outro (…) são vários exemplos! E dá-lhe Ministério Público para encher o saco, literalmente, acho que este povo que vive com polpudos salários não tem mais o que fazer! E no que interessa mesmo, o que se tem? Nada! A construção com dinheiro público de alguns estádios é um crime de lesa pátria! Até porque serão muito pouco utilizados depois da Copa Caxirola! Vivemos numa grande piada de mau gosto!! A propósito, também sou COXA BRANCA!!!
Um dos grandes culpados é a Rede Globo que manda e desmanda no futebol.
Esse domínio da Globo está matando o futebol no Brasil. Os dirigentes e as federeções tem culpa por deixarem e se venderem. O futebol no Brasil vai ser reduzindo economicamente a dois clubes de futebol, Corintians e Flamengo.
Quando se tenta comprar a consciência dos legisladores para tornar lei aquilo que supõe mantê-los no poder via populismo! Podemos esperar por exemplo que as decisões do STF dependam de último referendo do Congresso Nacional para livrá-los das condenas! Os outros setores seguem a mesma lógica…
Continuo sugerindo uma campanha liderada por vocês, jornalistas: desistir da olimpíada, por conta da corrupção e da incompetência brasileiras. A copa já era, mas ainda dá tempo de entregar a olimpíada e economizar alguns (nossos) bilhões de reais. Quem vai comprar a idéia?
falou e disse.
Uma realidade que mostra explicitamente como o “negócio” pode tirar todo o valor e espontaneidade da arte. Futebol é cultura, é arte, é história, é um fenômeno com poder de mudar realidades, mas, como as demais vertentes culturais em nosso país, encontra-se em queda livre. O que importa é faturar. Fabricar produtos e vendê-los. O acesso de um jogador ao selecionado é rifado, como declarado várias e várias vezes. Seleção — que perdeu o sentido da palavra já faz um tempão — não representa nada. E em que ficou todo o escândalo em torno da CBF? O Brasil colhe os frutos da nulidade política da população. A falta de cidadania é um preço alto que pagamos a cada dia de desmandos em nosso país. Em breve a “seleção” será escalada em um programa banal de TV.
Alguém já viu um fabricante de tênis patrocinando uma escola ???
André, impecável o texto, como sempre. Mas só um toque: a torcida do Bahia não jogou as caxirolas no gramado por discordar da política adotada pela CBF e sim porque ficou puta com árbitro, que não marcou um pênalti para o seu time. Não espere dos “baihunos” mais do que isso… abraço. Tom.
Tom Cardoso, como sempre um comentário idiota…”baihunos”…deveria ter um pouco mais de cuidado antes de usar essa expressão de maneira descontextualizada para exprimir seu bairrismo digno de mentes tacanhas e recalcadas.
Pedro, sou neto de baiano e meu pai adotou Salvador como sua cidade, onde trabalha há mais de 20 anos. Baihunos era um expressão inventada pelo Millôr para encher o saco dos músicos baianos.
r
Exato. E encheu mesmo, o pessoal ficou revoltado.
Ótimas considerações. Hoje só torço e vejo jogo do CORITIBA FOOT BALL CLUB e não perco mais tempo com a seleção. Acho essa história de COPA oportunista para aqueles que querem fazer a farra com o dinheiro público. As Federações extinguiram os lucrativos campeonatos regionais em prol de estaduais falidos. A TV quer bipolarizar os títulos no BRasil. A distribuição da cota é puramente política. O correto seria ter uma cota fixa igual para todos e uma parcela (uns 30%) de acordo com a venda de PPV e uns 20% de acordo com a colocação do time no ano anterior. Do jeito q estão fazendo nosso futebol Brasileiro vai virar um estadualzão em que 2 times sempre vencem e uma vez por década outro ganha. Manipulação de MASSA é a ordem da vez.
Excelente desabafo, André… Excelente…
Quem diz que os estádio são dominados por facções organizadas nunca pisou num deles
Não são não, imagina.
As (quadrilhas) organizadas chegam em cima da hora e dominam os lugares, expulsando os torcedores de verdade.
Clap, Clap, Clap. Aplaudo em pé.