O gênio que botou o mundo para dançar
25/06/13 07:05Quando leio um livro e acho que vale a pena indicá-lo aqui no blog, costumo marcar as páginas que trazem histórias relevantes e que merecem ser citadas. Normalmente, termino um livro com 15 a 20 páginas marcadas. Quando terminei “Le Freak”, autobiografia de Nile Rodgers, havia marcado quase 50.
“Le Freak” – ainda não lançado no Brasil – já entrou para minha lista pessoal dos livros mais incríveis sobre música.
Nile Rodgers foi o criador do grupo de discoteca Chic, famoso por sucessos como “Le Freak”, “Good Times” e “Dance, Dance, Dance”. Foi também produtor de alguns dos álbuns mais marcantes dos anos 80, como “Let’s Dance” (1983), de David Bowie, “Like a Virgin” (1984) de Madonna e “Notorious” (1986), do Duran Duran. Trabalhou com Diana Ross, Michael Jackson, Mick Jagger e centenas – centenas mesmo – de outros artistas.
Mas vamos deixar de lado por um momento a carreira musical de Nile Rodgers. Só a vida dele daria um livro espetacular. Não é à toa que um terço de “Le Freak” conta a infância e adolescência do sujeito.
A mãe de Nile, Beverly, tinha 13 anos quando ele nasceu. Beverly era negra, mas tinha raízes européias e indígenas. O pai de Nile era um percussionista de jazz de família africana. O casal logo se separou. Beverly teve filhos com vários outros homens – Nile é o único filho negro – enquanto o pai de Nile, que sofria de alcoolismo, acabou morando na rua, mendigando. E isso é só a primeira página.
Beverly se casa com um beatnik judeu, Bobby Glanzrock, vira junkie em tempo integral e manda o pequeno Nile morar com vários parentes, incluindo uma avó durona e uma tia com problemas mentais por ter sido violentada na infância.
São tantas as histórias incríveis sobre a infância de Nile Rodgers que é difícil destacar alguma. A que mais me deixou pasmo foi a de um criminoso chamado “Bang Bang” que se apaixona por Beverly, leva um fora dela e ameaça matar os filhos – incluindo Nile – se ela não voltar para ele. Beverly se esconde com as crianças e chama a polícia, que inicia uma caçada em todo o país por Bang Bang, então procurado por vários crimes. Esse era um dia normal na vida da família Rodgers.
Adolescente, Nile começa a se interessar por jazz, vira hippie depois de tomar LSD com uma comuna de freaks chefiada por Timothy Leary – 20 anos depois, numa festa, Nile ouve Leary contar a história do dia em que converteu dois jovens negros ao LSD e percebe que o personagem da história era ele próprio – trabalha limpando aviões num aeroporto de Los Angeles, onde acaba fazendo faxina no avião de Frank Sinatra, estuda música clássica, começa a tocar guitarra e consegue uma vaga na banda do lendário teatro Apollo, no Harlem.
No meio dos anos 70, Nile e seu parceiro musical, Bernard Edwards, montam o Chic. A inspiração veio do Roxy Music e – pasmem – do Kiss.
O Roxy Music é compreensível: com sua sofisticação sonora e aquelas capas chiques com supermodelos em poses de revista, o Roxy Music inspirou toda a discoteca. Já o Kiss interessou a Nile pelo anonimato da banda. Nile achou interessante o fato de os integrantes não se mostrarem e decidiu que o Chic também seria assim, mais um projeto que uma banda.
Entre 1975 e 1986, Nile Rodgers foi um dos grandes nomes do pop. Explodiu com o Chic e os discos que produziu – Sister Sledge, Bowie, Madonna, Dura Duran – lideraram as paradas. Com o sucesso e a fortuna, vieram imensos problemas com drogas, especialmente cocaína.
Nile cheirava tanto que seu contador um dia o aconselhou a presentear os amigos com pingentes de ouro: “Nile, ouro é mais barato que cocaína; em vez de comprar pó pra eles, dê ouro. Eles vão gostar e você vai poupar uma fortuna.” Uma vez, em plena paranóia cocainômana, Nile, que havia transado com a namorada de um traficante e achava que o marginal iria matá-lo, passou dias trancado no armário de um hotel de luxo, empunhando uma pistola 45 e uma espada de ninja.
Quem gosta de ler sobre os bastidores da música vai se fartar. Nile conta encontros com Michael Jackson, Diana Ross, Eddie Murphy (Nile fez a trilha de “Um Príncipe em Nova York”), Blondie e Bowie, entre outros. Numa festa na mansão de Madonna, na Flórida, Niles termina a noite no banheiro, cheirando e chorando – “Cara, você é demais! Eu tem amo, cara!” – com Mickey Rourke.
Os casos com Madonna são hilários. Certa vez, a “Material Girl”, triste porque Nile não havia dado em cima dela, pergunta se ele não a achava sexy. “Madonna, você é a coisa mais sexy que já vi na vida”, responde Nile. “Então por que você nunca quis me comer?” Nile, atordoado pela pergunta, explica que é o produtor do disco e não achava isso seja legal. “Isso não impediu nenhum dos meus produtores de tentarem me comer”, diz Madonna.
Nos próximos dias, contarei aqui no blog detalhes do encontro de Nile Rodgers e David Bowie, que resultou num disco clássico, “Let’s Dance”.
E aqui vai a íntegra de um documentário da BBC sobre Nile Rodgers, chamado, apropriadamente, “The Hitmaker”. Aproveite…
Andre,
trocar a clarineta pela guitarra por causa de um amor adolescente é uma das passagens mais sensacionais. Afinal o que nos motiva??? Essa menina salvou a história da música pop como conhecemos.
Abs!
Verdade, a história é muito bonita. E ele aprendendo com A Day in the Life? O livro é demais mesmo…