Um filme que mostra menos e assusta mais
16/08/13 07:05Alguns filmes merecem ser vistos simplesmente por remarem contra a maré. É o caso de “Os Escolhidos” (leia minha crítica na “Folha”, aqui).
O filme não é nenhuma obra-prima e não vai mudar sua vida, mas pelo menos tenta ressuscitar um tipo de cinema de horror que estava sumido das telas: o que assusta mais pelo que não mostra.
Em épocas de Youtubes e afins, em que as pessoas se acostumaram a ter todas as imagens à disposição e em todos os ângulos possíveis, parece um risco fazer um filme de horror que ainda deixe alguma coisa a cargo da imaginação do espectador.
Na história do cinema de horror, há um momento claro em que cineastas começaram a mostrar a violência mais explicitamente: foi na virada dos anos 60 para os 70, quando “A Noite dos Mortos-Vivos” (George Romero, 1968), “O Exorcista” (William Friedkin, 1973) e “O Massacre da Serra Elétrica do Texas” (Tobe Hooper, 1974) transpuseram para as telas dos cinemas o horror real que as pessoas viam na cobertura do Vietnã pela TV.
A grande crítica de cinema Pauline Kael tinha uma expressão para definir esses filmes: “Cinema Boo”, aquele que chocava pela repentina aparição de um monstro atrás da porta, como um trem-fantasma de circo.
Desde então, só cresceu a obsessão pela violência “de verdade”. Prova é a explosão dos gêneros “found footage” – filho bastardo de falsos documentários como “Canibal Holocausto” (Ruggero Deodato, 1980) e “A Bruxa de Blair” (Eduardo Sanchez e Daniel Myrick, 1999) – e “torture porn”, com “Jogos Mortais” e “O Albergue”, que se resumem a encenar torturas.
A lógica era simples: uma geração tão acostumada a ver violência na TV e em games não se surpreenderia mais como um horror ficcional. Só a realidade choca.
Por isso, foi uma boa surpresa ver “Os Escolhidos”, um filme em que os “monstros” raramente aparecem, a violência é implícita, e personagens não são figuras de cartolina.
André, gostaria de saber sua opinião sobre duas questões relacionadas a filmes de horror, mesmo sabendo que você provavelmente está cheio dos found footages e dos mockumentaries que têm grassado por aí:
– Você já viu o australiano ‘Lake Mungo’? Já é meio antigo, tem uns seis ou sete anos, mas para mim ainda é o melhor filme de horror produzido este século. É mockumentary, o que significa que não há sustos, mas é arrepiante o suficiente e muito bem tramado. Há boatos de que os EUA, para variar sem roteiristas e ideias novas, vão refilmá-lo.
– O que acha dessa que parece ser uma estratégia à ‘Bruxa de Blair’, mas bem mais macabra, do ‘Bitterroot Footage’? Descobri há pouco e ainda não tem muita popularidade, mas o vídeo que tem no site deles é um tanto quanto perturbador. É só procurar no Google; o vídeo tem menos de cinco minutos. Não há relatos de que um filme com esse nome esteja em produção, mas a curiosidade se atiça.
Abração
Cara, vou ficar te devendo, não conheço nenhum dos dois. Mas vou me informar.
Tem um bom também, que não mostra sangue mas assusta bastante, “A maldição do cubo card”, veja o que estão dizendo os espectadores: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/08/1328179-fora-do-eixo-deixou-rastro-de-calotes-na-origem-em-cuiaba.shtml
Mas isso é terror explícito!
André, você já assistiu Contatos de 4º Grau (http://www.youtube.com/watch?v=r25ZUxTURis0)? O que achou?
Aquele com a Milla Jovovich? Quase fui linchado quando elogiei o filme na “Folha”.
Nunca assisti a esses filmes do tipo Atividade Paranormal ou Jogos Mortais. Não me causam medo, mas uma sensação de desconforto, principalmente esses que exploram sequencias de tortura.
Também não gosto de filmes que dão sustinhos com o artifício clichê de aumentar o som na hora do susto.
Hoje me parece que ninguém sabe causar medo ou deixar as pessoas tensas na cadeira, querendo que aquela experiência acabe o quanto antes. Poucos diretores exploram o silêncio absoluto, pra mim muito aterrorizante.
Bluxa de Blair na época me causou medo, mas o filme foi tão “copiado” que hoje perdeu seu efeito. Acho que o último bom filme de medo que vi foi “Deixe Ela Entrar”….teve também “O Abrigo”, não é terror, mas é outro filme tenso e, de certa forma, perturbador.
Sei que não é sua praia, mas hoje existem muitos jogos de video game que criam um clima estupidamente aterrorizante, tenso, com tramas incríveis. Coisa de ter que desligar o jogo por um tempo.
De qualquer maneira, bom saber que apareceu mais um filme desse tipo. Como você disse na sua crítica, a história não é nova, mas é o tipo de história que, se bem contada, faz muita gente tremer na cadeira.
Barcinski
Off-tópico (mas nem tanto)
Matéria sobre o novo filme do Paul Schrader (que mês que vem estará no Rio). Diz que os estúdios investem em ‘independentes’…..
http://oglobo.globo.com/cultura/em-entrevista-roteirista-de-taxi-driver-touro-indomavel-fala-sobre-dirigir-lindsay-lohan-9567219
off-topic: Barcinski, tudo bem?
vi ontem o documentario Cinco Câmeras Quebradas e… meio brega falar isso, mas é transformador. Cinema político real, na unha. Vai passar domingo de novo no CineSesc (sp), com debate depois com o diretor Emad Burnat (casado com uma palestina/brasileira) e vai passar no Rio tb, tudo da 8a Mostra Mundo Arabe de Cinema.
Já vi, Denise, é muito bom mesmo. Muito boa dica do debate, se estivesse em SP, iria com certeza!
Sempre gostei mais desse tipo de filme, em que o terror e apenas sugerido, deixando que a imaginação do espectador preencha as lacunas. Meu filme favorito no gênero “terror implícito” é “Os Inocentes” de 1961, dirigido por Jack Clayton. É um filme que consegue assustar sem mostrar quase nada. Acho que teve uma grande influência sobre o filme “Os Outros”.
Oi André! Assistiu a Shutter (no Brasil saiu como Espíritos – A Morte está ao Seu Lado)?
Me lembro de ter visto a versão de 2004 que é Tailandesa e ter ficado umas boas semanas assustado
Tratando sobre violencia explicita vs implicita o que voce acha dos filmes do Haneke? Principalmente o “Violencia Gratuita aka Funny Games”? Para mim eh altissimo nivel…
Acho um dos melhores diretores do cinema atual.
Tinha assistido e gostado desse “Os escolhidos”. A mistura de suspense, ficcção e terror ficaram em muito boa pedida. Sem muitos exageros. Aquela primeira “exibição artística” na cozinha é uma das melhores cenas do ano e com o desenrolar da história ela tem uma explicação bem interessante. É sim uma excelente diversão.
Vou procurar assistir o filme. Não acho que o Exorcista seja um exemplo de “cinema boo”, quase não tem esses momentos de sustos fáceis. Pra mim o que impressiona mais é o clima. Mas concordo que seja um filme bem explicito, que mostra a Linda Blair sofrendo aquelas transformações e tal. Bom final de semana!
Como assim? Eu acho “O Exorcista” um filme muito bom, mas tem sim inúmeros momentos de “Cinema Boo”. A longa sequência do exorcismo é uma sucessão deles.
Com direito a sopa de ervilhas.
Seguido a definição que você colocou no texto: “Cinema Boo”, aquele que chocava pela repentina aparição de um monstro atrás da porta, como um trem-fantasma de circo. Eu não acho que o Exorcista tenha isso tipo de susto “trem fantasma”. Tem cenas grotescas e tensas, como a cena do exorcismo, mas não me lembro dessas cenas que algo aparece do nada pra assustar, como foi feito depois com Alien, Halloween, Night of the Living Dead e etc. Concorda? Abraço!
Não. E a cabeça da menina girando?
OK, você venceu!!! 🙂 Vamos dizer então que foi os primórdios do que viria depois. Abraço!
André, em São Paulo está em cartaz um filme chamado “Wrong”. É um dos mais malucos e nonsense que vi nos últimos tempos. Depois descobri que o diretor, na verdade, é o músico francês Mr. Oizo. Chegou a ver?
Não vi, Allan, mas parece interessante. Valeu pela dica.
Penso que as novas produções apostam nos formatos e negligenciam na trama em si. O argumento e o estilo de filmagem sobrepujam a narrativa, meio que apagando a importância do diretor. Os “climas” foram substituídos pela violência incontida.
Há sempre novos recursos, novas técnicas de apresentação mas o aporte crítico subjacente às obras parece ter sido deixado um pouco de lado.
Acho até que a gratuitade da violência dessas últimas décadas é um pouco responsável por isso.
Eu gosto do gênero Terror e aprecio mesmo essas novas produções, mas reconheço a beleza de filmes que aterrorizam sem ter que arrancar cabeças ou mostrar a cara do capeta.
Oi, André
Você não acha que A Bruxa de Blair, mesmo sendo um falso documentário, não entraria nessa categoria de filmes que sugerem muito mais do que mostram? Para mim, esse é o grande mérito do filme.
Eu gostei do filme na época, achei inventivo. O problema é que o artifício das supostas “cenas reais” foi tão massacrado nos últimos anos.
Sim, virou arroz de festa.
Em alguns filmes exageram tanto nas cenas tremidas que não dá nem para entender o que está acontecendo.
Eu concordo, pensei exatamente isso. A bruxa de Blair não mostra nada “explícito” e assusta pela imaginação.
Concordo, não entra mesmo na categoria dos que encenam cenas de tortura. Sugere mais do que mostra. E cria expectativa mais do que amendronta ou assusta.
Barcinski, seu texto pode dar a entender que o found footage é um gênero derivado do horror, mas é muito mais do que isso. Acho que é mais preciso dizer que se trata de um conjunto de filmes que se utiliza de práticas semelhantes e que se apoia na montagem para dar novos sentido a imagens não necessariamente produzidas pelo montador. Os exemplos são inúmeros, desde os filmes de Peter Forgács e Artavazd Pelechian até mesmo filmes de ficção que se utilizam de imagens documentárias. Há muitos videoartistas que se utilizam desse procedimento também.
Um abraço.
D.
Em nenhum momento eu disse que o “found footage” se limita ou nasceu do cinema de horror. Mas o tema do texto é cinema de horror e, dentro deste, o “found footage” é um dos subgêneros mais populares atualmente.
Barcinski, lendo meu comentário, você verá que eu disse exatamente o seguinte:
“seu texto pode dar a entender que o found footage é um gênero derivado do horror”.
Estou dizendo que seu texo “Pode dar a entender” uma coisa, o que é diferente de acusá-lo de dizer essa mesma coisa. Tenho certeza de que você sabe o que é found footage, mas apenas me preocupei com leitores que, porventura, não soubessem do que se trata e ficassem com uma impressão errada.
Esse tom defensivo e agressivo que você adotou em sua resposta desestimula o debate. Não quis confrontá-lo, apenas somar uma informação ao seu texto.
Um abraço.
D.
produção do insidious e atividade paranormal, deve ser ruim a beça isso ae!
Para assistir o Cidade alerta têm que ter ‘sangue no olho’, Brrrr.
Bom saber. Vou atrás. Particularmente, não curto, de maneira alguma, esses filmes de tortura tipo “Jogos Mortais” e “O Albergue”. Acho gratuito e imbecil.
Prefiro algo mais com terror psicológico. Se for pra ter sangue, ao menos que seja como os clássicos do passado repletos de humor negro, espírito de porco e tosqueira.
Oh yeah, Keri Russell está no filme….Ela ainda será minha!
Tubarão é assim não? Como o boneco não tinha ficado como Spielberg queria, ele resolveu usar esse recurso: o de assustar pelo o que não mostra.
Olá Barcinski ! Ainda acho que o melhor filme de terror “implícito” é o “Bebê de Rosemary” (o Mojica também pensa assim, voce bem sabe). Revi-o numa madrugada destas, no TCM e caramba, o filme não envelheceu, continua assustador. Exceto a Mia Farrow, que ficou velha e chata ! Um abraço.
Revi também no TC Cult. Parece que foi feito ontem.
Sem contar o peso que o filme ganhou após o episódio da família Manson.
Um filme de terror interessante é “A casa da noite eterna” de 1973.
Esse filme já está disponível há meses em Full HD nos torrents da vida.
Assim como Mud, Iceman, Only God Forgives e o mesmo aconteceu com o MaMa. Essas distribuidoras lotam as salas com os mesmos filmes e depois reclamam da pirataria.
Nessa linha desse tal “torture porn”, “A fronteira” é um filme legal. Agora “Mártires” é a coisa mais tosca que já vi.
Gostei do Mártires, meio tosco , mas lembro q daquela onda do terror francês , foi o único q gostei.
Mesmo sendo fã de cinema trash, já cansei há muito do “cinema boo”.
O terror insinuado, aquele que faz com que a nossa mente complete as lacunas em branco, é muito mais divertido – e também mais difícil de fazer.
Ser pego despreparado ou “com as calças na mão” como no final de “Sexto Sentido” (Shyamalan) é uma das melhores recompensas que um filme pode dar.
Só discordo da citação de Bruxa de Blair como obsessivo em termos de violência.
Sim, é um falso documentário. Mas não mostra absolutamente nenhuma cena explícita, muito menos o famoso “boo”.
Citei a “Bruxa de Blair” com um filme obcecado em mostrar a violência “real”, não “obsessivo em termos de violência”. Não é um filme particularmente violento.
O que apavora no filme não é o fantasma, pelo menos não pra mim. Quem já ficou perdido numa floresta deve ter esse filme na sua cabeceira, seguramente.
A quem interessar, o filme sobre o ex-baterista do Cream e Blind Faith, Beware of Mr. Baker, mencionado aqui tempos atrás, já está no cine torrent (a vera). Procure ler os comentários para ver se não é fake. São 5GB. Abs.
Olá André.
Sou um grande fã de filmes de terror, porém faz muito tempo que não assisto um que valha a pena. Não consegui me entusiasmar com o terror japonês que fez sucesso há alguns anos atrás e não vi e não gostei de jogos mortais, o albergue e cia limitada.
A minha última grande surpresa no cinema de terror foi o sueco “Deixa ela entrar”. Lembro de ter ido numa sessão à meia noite, super vazia. Tensão do começo ao fim.
Eu e minha esposa levamos uma sobrinha dela nesta sessão, que queria ver outro filme de vampiros, pois tinha adorado o crepúsculo. Lembro de ela ter saido branca do cinema, não falou nada até chegarmos em casa.
Acho que aqui no blog vc chegou a comentar uma versão americana feita desse filme. Vale a pena assistir?
Abço
Frank
Assisti as duas. A versão americana até que é surpreendentemente OK mas, na minha humilde opinião, você já viu a melhor parte.
“Deixe ele entrar” é bem bacana… sem nenhum apelo ao grotesco ou ao “cinema boo”, sem contar o conteudo “nao-terror” da historia muito bem destilado…
Filmaço.
O sueco, né? Eu não vi a versão americana, é boa?
O sueco é melhor, mas a versão americana é muito boa também, bem fiel à original.
Tanto “Deixe ela Entrar” quanto “Deixe-me Entrar” são ótimos. Stephen King disse ter adorado, e não é por menos é bem do estilo dele.
Um dos melhores filmes que já assisti de terro que não mostra monstro e tal foi a Casa das Almas Perdidas, quando vi o trailer desse filme eu me lembrei na hora da Casa das Almas Perdidas.
Adorei o documentario.