Você compraria uma biografia de Chico Buarque escrita por Chico Buarque?
18/10/13 07:05Em artigo publicado quarta-feira no jornal “O Globo”, Chico Buarque fez uma acusação seríssima ao pesquisador Paulo César de Araújo: segundo Chico, Araújo teria mentido ao dizer que o havia entrevistado para a biografia de Roberto Carlos.
“[…] Me disseram que a biografia é a sincera homenagem de um fã. Lamento pelo autor, que diz ter empenhado 15 anos de sua vida em pesquisas e entrevistas com não sei quantas pessoas, inclusive eu. Só que ele nunca me entrevistou.”
Araújo rapidamente esclareceu: ele havia, sim, entrevistado Chico, em março de 1992. E publicou as fotos para provar.
No dia seguinte, Chico pediu desculpas. Havia esquecido que concedera a entrevista.
Normal. Erros acontecem. Não é fácil lembrar um episódio ocorrido mais de 20 anos antes.
Mas Chico poderia ter evitado o mico se fizesse o que qualquer curso de jornalismo ensina: checar a fonte. Bastaria uma ligação para Araújo.
Por que Chico errou tão feio?
Talvez pelo menos motivo que levou Djavan a escrever, também em “O Globo”, outra afirmação no mínimo questionável: a de que editores e biógrafos “ganham fortunas”.
De onde Djavan tirou tal informação? Qual a fonte? Será que o compositor poderia dar ao menos UM exemplo de biógrafo brasileiro que ficou rico com seu trabalho?
Sugiro a Djavan ler dois textos: o relato de Mário Magalhães, autor de “Marighella”, sobre o prejuízo financeiro que teve com a extensa pesquisa para o livro, e o relatório “Retratos da Leitura no Brasil” do Instituto Pró-Livro, publicado em 2012. Este documento traz alguns dados que poderiam ter levado o compositor a pensar duas vezes antes de decretar a riqueza de biógrafos:
– Brasileiros lêem, em média, quatro livros por ano, mas terminam apenas 2,1 livros. Isso inclui livros escolares.
– 75% dos brasileiros nunca pisaram numa biblioteca.
– A Bíblia é o livro mais lido no Brasil, seguido por livros didáticos, romances, livros religiosos, contos e livros infantis. Não há sinal, na lista, de livros biográficos.
Talvez Chico e Djavan tenham errado porque não se deram ao trabalho de checar a informação que estavam divulgando.
É curioso que artistas que brigam pela censura prévia a biografias e pelo poder de decidir quem não escreverá sobre eles, pareçam tão pouco preocupados com a checagem de fatos.
Em seu livro de memórias, “Verdade Tropical”, Caetano Veloso elogia o filme “À Meia-Noite Levarei Tua Alma”, de José Mojica Marins, o Zé do Caixão. Caetano diz que o nome do cineasta foi tirado de José Mojica (1896-1974), um frade mexicano que fez fama nos anos 50 cantando canções sentimentais.
Errado: nosso José se chama José porque sua mãe, Carmen Mojica, era devota de São José.
Na mesma página, Caetano chama José Mojica Marins de “estreante independente”.
Errado de novo: “À Meia-Noite Levarei Tua Alma” foi o quarto longa-metragem de Mojica.
Não são erros graves, mas são erros, que poderiam ter sido evitados com um mínimo de rigor na apuração.
Não estou dizendo que jornalistas não erram. Erramos sim, e muito, especialmente nessa época de encolhimento de equipes nas redações. E nada pior para a credibilidade de um jornalista que divulgar uma notícia falsa ou errada. É um desserviço.
Mas a solução para diminuir os erros não é controlar a informação, como defendem Chico, Caetano, Djavan e os outros integrantes do grupo Procure Saber, mas democratizá-la. Ninguém tem o direito de controlar a História.
Nossas livrarias não oferecem biografias decentes de Pelé, Xuxa, Maluf, Raul Seixas ou Sílvio Santos. Não temos uma biografia sequer de Roberto Carlos, o maior popstar que o Brasil já teve (quer dizer, teríamos, se o próprio Roberto não a tivesse censurado). Deveríamos, sim, ter quinze, vinte, trinta biografias do Rei, todas disputando para ver qual é a melhor e mais completa.
Escrever a verdade dá trabalho. Demanda tempo e determinação. Por isso, biografados deveriam incentivar a busca pela verdade, facilitando e auxiliando o trabalho de pesquisadores, e não iniciar uma cruzada obscurantista para impedi-lo.
P.S.: estarei sem acesso à Internet até o fim da tarde e impossibilitado de moderar comentários. Caso seu comentário demore a ser publicado, peço desculpas.
FINALMENTE, CHEGOU LIBERACE!
Sábado, às 22h, a HBO exibe “Behind the Candelabra”, de Steven Soderbergh, quase cinco meses após a estreia na TV norte-americana (depois as emissoras reclamam quando o público apela ao Cine Torrent…).
O filme conta os dez últimos anos da vida do pianista Liberace (1919-1987) e seu relacionamento com o assistente Scott Thorson. É imperdível.
Liberace foi um dos maiores popstars do mundo entre as décadas de 50 e 70, conhecido por seu estilo excêntrico e shows que eram celebrações do “kitsch”, com cenários imitando palácios e roupas extravagantes. Mesmo em Las Vegas, capital mundial da cafonice, ele se destacava como um pavão em meio a urubus.
Durante toda a vida, Liberace escondeu o fato de ser gay. Suas fãs não podiam saber. Ele chegou a processar jornais que insinuaram seu gosto por rapazes jovens e musculosos, apesar de viver cercado deles (fosse no Brasil, os artigos nem teriam sido publicados).
No filme, Michael Douglas interpreta Liberace. Foi uma escolha ousada e muito feliz. Periga ser o melhor papel da carreira de Douglas.
Matt Damon faz Scott Thorson e o sumido Rob Lowe interpreta um cirurgião plástico que transforma Liberace e Thorson em bonecos de cera. Damon e Lowe estão sensacionais.
Liberace foi uma figura fascinante, símbolo da opulência e exageros estéticos de Las Vegas, um Taj Mahal criado no deserto e meca do novo-riquismo norte-americano do pós-Segunda Guerra.
“Lee”, como era chamado, sonhava em ser pianista clássico, mas a Grande Depressão o forçou a aceitar empregos em boates, tocando música popular.
Nos anos 40, começou a criar seu estilo peculiar de apresentação, com roupas chamativas e interação com a plateia. “Não faço concertos, faço shows”, dizia. Ficou famoso na TV e criou espetáculos audiovisuais nababescos em hotéis de Las Vegas.
O filme de Soderbergh começa em 1977, quando Liberace já começa a entrar em declínio. O pianista é mostrado como um ególatra que descarta um amante assim que se interessa por outro.
Thorson conhece Liberace em um show e inicia um romance tumultuado com o músico, piorado depois que Thorson é convencido a fazer uma plástica e começa a tomar remédios tarja preta prescritos pelo cirurgião.
Um tema polêmico da carreira de Liberace e que o filme não explora é o de sua ligação com o satanismo. Liberace foi ligado à Igreja de Satã, liderada pelo ocultista Anton LaVey (1930-1997), mas morreu negando o fato. Aliás, a confraria de LaVey, que reuniu, além de Liberace, Sammy Davis Jr. e Jayne Mansfield, daria um filme sensacional.
P.S.: Estarei fora no início da semana que vem. O blog volta na quarta, 23. Até lá!
Melhor blog do Brasil,vale a visita diaria….parabens!!
Ja escreveu algo sobre a treta do Banksy x King Robbo?
abs!
nooosa !!!!!! um especialista em José Mojica Marins !!!!!!!! uauuuuuu !!!! sou teu fã, cara ! Um especialista de um cienasta udigrudi underground overact overbook quaquaqua ! O que virou o jornalismo cultural: lembra da frase do Frank Zappa, senhor Barcinski ? Pois é …
André, você cita o “Verdade Tropical”. Você conseguiu ler a coisa toda até o fim? Se sim, me diga como conseguiu!
Olha, eu “ganhei” (por pura sacanagem) uma edição do livro. Tentei ler para ver se era tão ruim quanto imaginava. Para não criticar sem argumentos. E achei insuportável, uma auto babação medonha.
Faltou pouco para ele dizer que criou o céu e a terra. Talvez o livro passe a ser interessante em algum momento, mas larguei a coisa após umas poucas dezenas de páginas. Sério, achei insuportável.
“Moderar comentarios” nao é uma forma de censura?
Não, Luis, é uma forma de evitar que a caixa de comentários vire um esgoto de xingamentos. Compare essa caixa de comentários aos de blogs de futebol, por exemplo. Você sabe isso, só está tentando ser esperto para mostrar como o blogueiro é hipócrita e injusto, não é mesmo?
Resposta errada. A pergunta era retórica. É óbvio que “moderar comentarios” é uma forma de censura.
Tá bom, Luis, fica combinado assim. Mas porque pergunta, se já tem a resposta que acha correta? Não permitir discussão não é uma forma de censura?
Perguntei justamente pq acho interessante a discussao. Meu intuito foi te provocar para saber qual seria sua justificativa.
“Moderar” é sim uma forma de censura, nao é questao de achar.
Claro que vc não acha interessante discutir. Tanto que já tinha opinião formada antes. Só pra vc saber, os comentários do blog só são de alto nível porque os xingamentos, frases racistas, nazistas e homofóbicas, etc., são moderados. Sugiro que vc entre em um blog de futebol com comentários não moderados, pra ver como é. Nada menos democrático que aquilo. Pela sua lógica, impedir preconceito é “censura”.
Caro Barcinski,
concordo com o conteúdo, mas a forma ficou esquisita.
Você está sugerindo que o Chico e o Djavan chequem as fontes? Mas eles não são jornalistas. Eles não têm que fazer isto. Li “Verdade Tropical” pelo o que ele é. Um livro de memórias. Jamais o tomei como fonte de informação confiável para alguma coisa.
Quem tem checar as fontes são seus colegas e você há de convir que há “trocentos” (aí na Folha mesmo tem casos célebres) que não fazem isto…
Esse povo da MPB exagerou na dose e censura prévia é um retrocesso. Quanto a isto você tem toda a razão e deveríamos ter duzentas biografias de quem quer fosse.
Por outro lado, tá na hora do jornalismo, de um modo geral, no Brasil (sim, estou generalizando) amadurecer um pouquinho e começar a se perguntar “quem controla o mau jornalista?”. Desta pergunta depende a gente não passar por situações absurdas – e pouco comentadas, a meu ver, na imprensa brasileira – como a que rolou dois anos atrás com o “News of The World” na Inglaterra.
Repito: sou contra qualquer forma de censura prévia. No entanto, acho que este debate DEVE ESTAR atrelado a uma debate sobre as responsabilidades do jornalismo, e este último, tenho a impressão, ainda é muito tímido no Brasil.
Ah, entendi: quer dizer que o Chico Buarque pode acusar, em um dos maiores jornais do país, um biógrafo de ter inventado uma entrevista, mas ele é desculpado porque não é jornalista?
Do texto sobre “Behind the Candelabra”, só pra constar que Rob Lowe não anda sumido. Ele faz um personagem fixo na série “Parks and Recreation”, da Amy Poehler, já há uns três anos. Abs., André.
O Diego, você desenterrou esta série, hein? (risos)
Ler dói, escrever constrói. Quem faz da palavra escrita seu ganha pão é digno, corajoso. Palavras destroem reputações, unificam povos, gravam o tempo, estão nas canções e na boca dos canhões. Estúpidos quem delas foge, elas sempre os alcançarão. Palavras são meu livre-arbítrio. São minhas e partilho com quem convive com a dor de buscar conhecimento.
Texto brilhante André…
Valeu, Fernanda…
André, fizeram um kickstarter que quer pintar favelas do Rio. Falta arrecadar mais dinheiro e só restam 10 dias, compartilhem se gostarem do projeto: http://www.kickstarter.com/projects/1953408692/painting-an-entire-favela-in-rio-de-janeiro?ref=discover_pop
Barça!
Seria legal você lançar um livro sobre essa tentativa de censura de biografias e compará-las com situações no exterior.
Argumentos não faltam.
Abs
uma dúvida jurídica:
se alguém lançasse a biografia fora do brasil, não teria problemas, certo?
depois de lançada no exterior, uma editora nacional resolve publicar a obra. necessitaria da autorização do biografado?
Boa pergunta, não sei como funciona.
A Sra Lily Safra conseguir que fosse proibida a venda no Brasil de sua biografia não autorizada publicada no exterior. ( Gilded Lily, de Isabel Vincent ).
Beleza, André? Olha, nesse ponto das biografias, a questão é muito complexa. Na minha opinião, a mídia brasileira muitas vezes tem uma agenda política própria e isso se reflete também no mercado editorial. Um juiz sério do Sudeste foi acusado levianamente de prevaricação, num órgão de comunicação nacional , ou seja, julgar para atender a interesses privados. É o tipo de coisa que destrói uma carreira e uma vida. A indenização pífia não recompôs a honra do magistrado. As indenizações no Brasil, decorrentes de assassinato de reputação, pelos meios de comunicação, são ridículas e o estrago já está feito. Uma coisa está ligada à outra. Por isso, tenho sérias dúvidas sobre a licitude dessa opção. Nos EUA, as publicações são livres, aparentemente, mas as indenizações judiciais contra difamações são exemplares. Veja o caso de Paulo Francis. No Brasil, ao contrário, juízes frequentemente têm medo de julgar contra os conglomerados da comunicação, porque podem eles também ser demonizados. Bom, essa é minha opinião. Abração, Henrique
Beleza, Henrique? Se a Justiça é falha, corrija-se a Justiça, ora, não aprove a censura, não acha?
André, o problema é que corrigir o judiciário no Brasil, quanto a essas questões, é um debate necessário, porém prévio a se analisar o direito à privacidade, que é constitucional, assim como a liberdade de imprensa. No entanto, já hoje veja os papparazze (é assim que escreve?), que violam diariamente a primeira, auferindo dinheiro sobre a intimidade dos outros. Não existe no Brasil um Judiciário que possa conter esse tipo de violência contra o indivíduo e sua família. Veja o caso da princesa Diana. A velocidade do lucro é muito maior. Então, verdadeiros “papparazze” das biografias podem assassinar reputações impunemente e esse é um dado da realidade que não pode ser esquecido de forma alguma. Esse debate sobre os limites do público e do privado são contemporâneos a facebook, realitiy (?) shows etc., onde as próprias pessoas cedem sua privacidade ao público. Sendo voluntário, nada contra. Se compulsório, me faz recordar o panoptismo de que tratavam Foucault e Orwell. Tendo a privilegiar o direito à intimidade. Na minha opinião, contudo, o STF vai terminar julgando conforme o interesse da mídia. Que pelo menos o debate seja aprofundado e sem precipitações. Abração
E no caso de um descendente de Hitler querer censurar uma biografia por atentado à intimidade, como ficamos? Ou os sucessores de dom Pedro quererem cobrar por menções ao monarca em livros de História, como ficamos?
Sem dúvida, essas são boas indagações parea reflexão. Qual seria o conceito de personagem histórico? Hitler e Dom Pedro estão mortos há muito tempo. Suas intimidades e relações privadas já não subsistem, pois são eventos antigos, onde todos já estão falecidos. A rigor, suas intimidades e relações íntimas personalíssimas não são atingidas por publicações presentes. A intimidade é personalíssima, insuscetível de transferência. A Marquesa de Santos e Pedro I não ficariam encabulados por quaisquer revelações. O problema maior é a invasão de privacidade de pessoas vivas, cujos danos podem ser enormes, sejam elas artistas ou não. O debate não conporta respostas fáceis. É isso aí. Abração!
Um ótimo artigo de um ótimo jornalista. Leiam:
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/janiodefreitas/2013/10/1356677-palavras-sem-algemas.shtml
André, li essa matéria aí embaixo. Dê uma lida nela, antes de ver minha opinião em seguida…
Jornalista que foi exposta por ex como prostituta na web tenta se recuperar
A jornalista Rose Leonel teve a vida destruída depois que o ex-namorado publicou fotos íntimas dela na internet. Eles estavam juntos havia quatro anos e a vingança aconteceu quando ela decidiu terminar o relacionamento. O caso ocorreu em janeiro de 2006 e Eduardo Gonçalves da Silva foi condenado a um ano e 11 onze de prisão, além de R$ 30 mil de indenização. Dinheiro que Rose nunca recebeu e uma pena que ela considera irrisória.
— Era uma fantasia dele fotografar e filmar nossas relações. Depois de dois anos, acabei cedendo. Eu não sabia, mas dormia com o inimigo. Foi um assassinato e me considero sobrevivente de tudo isso. Todos os dias essas fotos ressurgem e preciso criar forças para tocar a vida.
A repercussão foi tanta, que Rose contratou um perito particular para ajudar a remover parte do material. Segundo o perito Wanderson Castilho, eram mais de sete milhões de sites com fotos da jornalista. O homem a anunciava como garota de programa e colocava os telefones pessoais dela para contato. Rose recebia mais de 500 ligações por dia de homens interessados nas divulgações.
Rose ainda não conseguiu medir o tamanho do estrago que a situação teve em sua vida. Ela perdeu o emprego na época, a filha foi agredida na escola e o outro filho precisou ir morar fora do País para escapar das retaliações. Todos sabiam e as agressões verbais eram constantes. Sete anos após o ocorrido, ela ainda não conseguiu se relacionar com mais ninguém
— Eu sinto que ele é doente. Quis terminar o namoro porque ele brigava demais com os meus filhos. Não queria me casar com alguém que apresentava problemas com as crianças. Hoje, depois de tudo isso, eu preciso praticar diariamente o perdão em relação a ele e só a fé em Deus é capaz de manter viva.
Eduardo Gonçalves da Silva foi condenado em primeira instância em junho de 2010. Ele recorreu da decisão judicial e pediu para cumprir a pena com serviços sociais. A 4ª Vara Criminal de Maringá (PR) decidiu, em 2011, que ele substitua a pena por serviços sociais e pague R$ 1.200,00 à vítima, mensalmente. Rose luta para que o valor seja corrigido e alega que não recebeu nenhum dinheiro ainda.
Fonte: R7.com
Continuando então…
Claro que foi uma fraude e um crime terrível, mas poderia ter sido, em vez de fotos na internet, uma biografia. Veja o que aconteceu, então, num caso limite como esse, e a resposta do Judiciário como ela de fato é.
É apenas para nos perguntarmos como as coisas realmente se processam no Brasil e formularmos a questão que me parece central: o mundo pode viver sem biografias não autorizadas tratando de temas relativos à privacidade alheia? o mundo pode viver sem proteção à intimidade dos indivíduos? O que é mais importante para a convivência social, para ponderarmos a escolha entre ambos os valores?
Eu também entendo o conceito de “censura”, no seu aspecto negativo [pois há censuras lícitas], como uso da força contra um menos forte. Pode haver censura de ditaduras militares contra jornais, de regimes religiosos contra divergências e heresias, mas quando é um poderoso mercado editorial e grandes conglomerados de comunicação social contra o indivíduo, a inequação se inverte e aí esse indivíduo, a pessoa humana, é que se torna o mais fraco.
Nesse contexto, não chamo a proteção da sua intimidade como censura, mas como um verdadeiro direito político de resistência. Essa é a minha percepção dessa realidade.
Abração
Pô, Henrique, como vc pode comparar um livro, que leva anos pra ser feito, com um imbecil que publicou fotos na web?
André, com uma liberalização ampla, temos que trabalhar com todas as hipóteses. Essa é uma delas. Claro, uma hipérbole. Mas uma possibilidade. Podemos pensar em criminosos como o Murdoch e nos perguntarmos: como pôde acontecer? Não nos iludamos quanto ao poder do interesse econômico. Há uns 20 ano imaginaríamos coisas como Big Brother etc? Não devemos analisar a realidade apenas numa perspectiva do que julgamos possível, mas do que efetivamente pode acontecer. Qual Lei estabelece que uma biografia deva ser um livro sério, ou um texto de 20 páginas cheias de calúnias, altamente vendável, por esse tipo de público?
É impossível registrar a história de um país privilegiando o direito à intimidade de quem fez a história (pelo bem e pelo mal). As pessoas têm que ser responsáveis pelos seus atos e não tentar escondê-los. A sociedade deve evoluir e ser educada o suficiente para não se chocar com erros de conduta e/ou problemas psíquicos ou físicos (‘errare humanum est’, não?). De outro modo haveria o risco de o dispositivo (proteção à intimidade) servir, por exemplo, para ocultar atos ilícitos que deveriam estar registrados nos livros de história. O dano da censura é maior pois prejudica toda a sociedade e não uma vida privada.
E enquanto a justiça não é corrigida?
Vc quer censura temporária, é isso?
Não, claro que não. Como eu já disse, acho que a palavra censura não se aplica nesse caso. Acho também que foi aberta pelos compositores uma discussão pertinente e importante e por incrível que pareça, eles estão sendo infinitamente mais elegantes que seus oponentes, esses muito mais agressivos. Fiquei estupefato com a quantidade de opiniões recalcadas e ressentidas tanto aqui no blog quanto na imprensa de um modo geral. A MPB virou o inimigo público número 1. Além disso, como disse o Henrique Cavalcanti, é inocência achar que o judiciário aqui no Brasil pode ser facilmente corrigido. Vai levar muito tempo. Mas concordo com boa parte dos seus argumentos também. Seria um atraso não podermos ler sobra a vida de personagens importantes da nossa história. O melhor seria tentar uma solução levando em consideração peculiaridades do nosso país.
André, só uma curiosidade: Eu lembro de um episódio do seriado dos anos 60 Batman em que o Liberace fazia uma participação especial.
André, sobre o filme faltou comentar o beijo entre o Michael Douglas e o Matt Damon, que de certa forma chocou até os americanos. Cena parecida eu vi no final dos anos 70, em um show do Caetano Veloso no Radar Tantan (SP), onde o Caetano beijou na boca a banda inteira que o acompanhava no final do show. Se esta informação for colocada na bio do Caetano serei processado
??????
Eles ‘não procuraram saber’.
A questão sobre erros de apuração, acredito, foi colocada como uma forma de diversionismo. Mesmo a calúnia ou difamação – que são sérias – entram nessa discussão como forma de dourar o objetivo real que é evitar a publicidade de verdades que eles consideram constrangedoras (informações que talvez possam se encaixar, aí sim, no direito à privacidade. Mas, mesmo se admitirmos isso, os argumento deles ficam bem mais limitados). Não se combate o erro nesse caso, mas o acerto, pelo menos do ponto de vista da apuração.
Até a discussão sobre a morosidade da Justiça – que é verdadeira -, me parece foi pouco aprofundada. Ela não é o único meio de reação. O biografado pode vir à publico para esclarecer ou desmentir passagens que ele julgar incorretas. Imagine o espaço que o Roberto Carlos teria para isso. Poderia ficar o Faustão, emendar com o Fantástico e a Ana Maria Braga para contar a história do jeito que ele quiser. Falaria pra zilhares de pessoas a mais do que o biógrafo e, este sim, acabaria difamado.
Abraço
As atitudes desvairadas dessa moçada que faz parte do Procure Saber, me levam a crer que a escolha do nome do grupo foi equivocada. Eles próprios não procuram saber nada. Acham que já sabem tudo.
À meu, ver sucumbiram a um dos piores males do envelhecimento: A Síndrome da Arrogância Intelectual.
O prognóstico é reservado,visto que o tratamento é, por vezes,muito doloroso:Humildade em doses elevadas..
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Chico, Caetano e amigos estão dando tanto tiro nos próprios pés que daqui a pouco só restará um toco.
É só esperar eles morrerem que os herdeiros liberam a biografia por quaisquer dois dinheiros.
A obra e a militância de um artista transcende a arte, começa a fazer parte da história. Imagine proibir a biografia de Frank Sinatra, não se negaria o conhecimento sobre a obra do maior cantor americano do século XX, mas também sua ligação com a máfia e sua importância na eleição de John Kennedy, talvez até se descubra futuramente se essa relação com a máfia teve relação com a morte do presidente. A vedação de biografia é impedir o conhecimento de fatos históricos, é impedir um país de se conhecer. P.S. A maneira correta de se escrever ‘seriíssimo’ é com a letra ‘i’ dobrada.
Um dos textos mais lúcidos que li acerca do tema das biografias.
Falando em biografias, já leu a do Tony Iommi, André? Não me lembro se você já comentou dela. Pelo menos não achei no histórico do blog.
Já sim, Bia, é bem divertida. Deveria ter escrito sobre o livro na passagem do Sabbath pelo Brasil, vacilei. Vou ver se escrevo nas próximas semanas.
Seria simplesmente otimo lê um biografia, que quebrasse esta aurea de mitos desta turma da esquerda, ( como é feita as biografias na Inglaterra, detonando os mitos) que chico não passa de um comunistinha idiota, que adora Paris, e que tudo sobre a seu respeito e mentira, e que dilma, jamais foi tortura e que entregou seus amigos na primeira pressão, e outros mitos iriam por terra, SERIA OTIMO LÊ BIOGRAFIA INTERESSANTES ASSIM.
Que tal o sr. aprender a escrever ?
Teu chapa o Forastieri escreveu um belo post lá no blog dele sobre esse assunto Biografias.
Anton LaVey era um tremendo picareta sua vida daria um ótimo filme!!!!!
André, e será que o Steven Soderbergh conseguiria fazer um filme como o Liberace, se o artista em questão fosse algum membro do Procure Saber????
De jeito maneira.
Com certeza não, pois o filme foi feito a partir de uma biografia não autorizada: http://mauriciostycer.blogosfera.uol.com.br/2013/10/23/sem-uma-biografia-nao-autorizada-nao-existiria-o-telefilme-vencedor-do-emmy/
Ainda: realmente a afirmação de Djavan sobre “fortunas” talvez não seja correta na maioria dos casos e pega muito mal. Mas o “quanto” não interessa. Uma biografia é feita do trabalho de um biógrafo, de um editora e da obra e/ou popularidade de um biografado. Mesmo que o lucro seja de 1 real, todos merecem receber compensação, como em qualquer outro tipo atividade.
Confesso que não tenho uma opinião definida e final sobre o assunto, mas assim como no título do texto me permito fazer umas perguntas também:
Você compra o CD do Chico Buarque por causa do Chico Buarque? Você vai no show do Chico Buarque porque gosta da obra do Chico Buarque? Você quer ler e compra a biografia do Chico Buarque porque o Chico Buarque e sua obra lhe atraem? Se o mérito é dele por alguém comprar a biografia, ele não deveria receber por isso, assim como ele recebe por venda de discos e de ingressos? Se ele não fez nenhum acordo sobre a venda dos livros, que direito tem uma editora de lançar um produto comercial, sem fazer um acordo prévio com ele? A questão da liberdade de expressão e direito ou não à privacidade de “pessoas públicas” realmente é polêmica e subjetiva, mas a questão financeira pra mim é clara. Pra mim um artista merece receber compensação financeira por qualquer produto que seja vendido devido a seu nome, obra ou popularidade.
Vinicius de Moraes pagou alguma coisa a Helô, por Garota de Ipanema? Fio Maravilha recebeu alguma coisa do Jorge Ben? Caetano pagou alguma coisa pro Menino do Rio? Não, apesar de os artistas em questão terem ganhado dinheiro explorando o nome de outras pessoas.
Respondendo sua pergunta, sim, Fio Maravilha processou Jorge Ben por usar seu nome numa música e teve ganho de causa. E o sua lógica é diferente da minha: as pessoas gostam dessas músicas por causa da música em sí, e não porque elas falam da Helô ou do jogador Fio. Ao contrário das biografias, que são compradas pelo interesse no biografado.
Estava acompanhando as discussões e achando tudo um tanto estranho.. para mim parecia já um retrocesso, censura etc… somada a decepção de ver quem estava apoiando a “nova censura”.., com base nos últimos debates e comentários de vários artistas desse grupo Procure Saber, comecei a ficar com medo e / ou vergonha alheia dos mesmos.. mesmo dos que eu admirava pela obra musical / artística. Meu marido e eu lemos vários tipos de livros por ano, e vira e mexe temos nossa fase de Biografias e afins, as melhores e com mais cara de ter fundo de verdade não são chapa branca, como me parece ser a proposta do grupo (somente autorizada e com o $$ garantido). Sinceramente, assim como fazemos com o nosso supermercado do dia a dia, vou procurar filtrar mais e ouvir, ler e assistir somente o que me parecer ter melhor base humana e alguma coerência pelo menos, tipo um boicote mesmo.
Se o problema é graninha, não vou dar nenhum tostão pra quem se dizia vítima da ditadura e do “mainstream” e agora vem com papinho de “não escreva sobre mim por que você vai dizer inverdades e ainda nem vai me pagar” por exemplo.
Fora que, será que o Roberto Carlos tem algum outro problema além de não querer que digam que ele tem uma problema na perna? E a Xuxa que fez filminho porno e ai processa quem publica essa parte sobre ela? Que saco esse povo…