Um leitor pediu, e aí vai: uma lista de dez ótimos livros-reportagens.
Note bem, não são biografias, mas livros sobre um determinado acontecimento histórico.
Tentei evitar os mais óbvios. Seria moleza indicar “Dez Dias Que Abalaram o Mundo” (John Reed), “Todos os Homens do Presidente” (Bernstein & Woodward), “Hiroshima” (John Hersey), “A Sangue Frio” (Truman Capote) ou “A Selva” (Upton Sinclair). São todos clássicos absolutos e precisam ser lidos.
Optei por livros que saíram no Brasil. Alguns estão em catálogo, outros podem ser achados em sebos (procure no www.estantevirtual.com.br).
Aqui vão, em ordem cronológica, dez livros marcantes, sobre temas idem:
Operação Massacre – Rodolfo Walsh, 1957
Inédito no Brasil até o ano passado, o livro conta a história de um fracassado contragolpe de Estado peronista, em 1956. Os líderes são presos e fuzilados, assim como vários operários que não tinham nada a ver com a história.
“Operação Massacre” é um livro pioneiro do “new journalism”, estilo que misturava reportagem a textos mais autorais e livres.
Walsh era um homem de extremos: direitista na juventude, passou a apoiar a luta armada de esquerda nos anos 70, e acabou morto pela ditadura militar argentina.
O Segredo de Joe Gould – Joseph Mitchel, 1965
Eu disse que não incluiria biografias nessa lista, e esse livro, apesar de parecer, não é uma biografia comum, mas um relato sobre a vida do bairro boêmio de Greenwich Village dos anos 20 e 30, centrado em uma de suas figuras mais emblemáticas, Joe Gould, um maltrapilho que andava pelo bairro falando de seu projeto monumental, “A História Oral do Nosso Tempo”.
O livro marcou a consagração e, curiosamente, o fim da carreira de Mitchell, um dos escritores mais famosos do staff da “New Yorker” e que não conseguiu escrever mais nada até sua morte, em 1996.
Hell’s Angels – Hunter Thompson, 1966
Meu livro predileto de Thompson é “Medo e Delírio” (“Fear and Loathing in Las Vegas”), mas confesso que não sei se é reportagem ou ficção (talvez nem o próprio Hunter soubesse).
Fico então com “Hell’s Angels”, primeiro livro de Thompson, sobre a gangue de motociclistas que aterrorizava a Califórnia. Saiu por aqui pela Conrad.
Todo mundo adorou o livro. Menos os Hell’s Angels, que quase mataram Hunter de tanta pancada, depois que ele chamou a atenção de um deles por bater na mulher.
Honra Teu Pai / Os Honrados Mafiosos (Honor Thy Father) – Gay Talese, 1971
Pensei em escolher “O Poder e o Reino”, história do “The New York Times”, mas optei por “Os Honrados Mafiosos”, que foi relançado recentemente no Brasil.
O livro conta a história da família Bonanno e sua luta contra clãs rivais da Máfia italiana nos Estados Unidos. Foi um “best seller” e é, até hoje, um dos textos clássicos do “new journalism”.
Tempo Para Morrer (The Onion Field) – Joseph Wambaugh, 1973
Em 1963, na Califórnia, dois bandidos pés-de-chinelo são parados por um carro da polícia. Eles seqüestram os dois policiais e os levam para uma plantação de cebolas, com o objetivo de executá-los. Um dos policiais é morto, mas o outro consegue escapar.
Wambaugh traça um perfil dos quatro personagens da história – os dois bandidos e os dois policiais – e relata não só o crime, mas os muitos anos do processo jurídico kafkiano que se segue. Um livro muito triste e emocionante.
Manson (Helter Skelter) – Vincent Bugliosi e Curt Gentry, 1974
Bugliosi foi o promotor que ajudou a condenar Charles Manson e sua gangue pelos assassinatos de Sharon Tate, mulher do cineasta Roman Polanski, e de quatro outras pessoas, em 1969.
O livro conta em detalhes o crime e o julgamento de Manson e de seus seguidores fanáticos. É apavorante. Foi o livro-reportagem mais vendido da história.
A Luta – Norman Mailer, 1975
Nunca houve uma luta de boxe como a de Muhammad Ali e George Foreman, no Zaire, em 1974. Norman Mailer estava lá e conta tudo: o fanatismo da torcida local, a miséria do país e a brutalidade de seu ditador, Mobutu. Mas o melhor é mesmo a descrição da luta. Leia e depois assista a “Quando Éramos Reis”, documentário sensacional sobre o combate, em que o próprio Mailer aparece.
Aracelli, Meu Amor – José Louzeiro, 1976
O caso Aracelli marcou época. Em 1973, na cidade de Serra, próxima a Vitória, uma menina de 8 anos não voltou para casa depois da aula. Seu corpo foi encontrado num matagal, com sinais de tortura e abuso sexual.
Suspeitas recaíram sobre dois playboys, filhos de famílias ricas e influentes do Espírito Santo. Depois, surgiram indícios de que a própria mãe da menina, uma boliviana que faria parte do tráfico internacional de cocaína, teria usado a filha como “mula”.
José Louzeiro, autor de “Infância dos Mortos”, livro que inspirou o filme “Pixote”, lançou em 76 esse livro sombrio e revoltante sobre o caso Aracelli.
Barbarians at the Gate – Bryan Burrough & John Helyar, 1990
Não achei nenhuma informação sobre o lançamento desse livro em português. Se você lê em inglês, não perca. Se não lê, pode assistir ao ótimo filme que a HBO fez em 1993, “Selvagens em Wall Street”, inspirado no livro.
“Barbarians at the Gate”, considerado por alguns o melhor livro sobre negócios já escrito, conta a batalha – de egos e dinheiro – pela empresa RJR Nabisco, em 1988. O tema continua atualíssimo.
Gostaríamos de Informá-lo de que Amanhã Seremos Mortos Com Nossas Famílias – Phillip Gourevitch, 1998
Gourevitch, que escreve para a “New Yorker”, relata cem dias do genocídio da maioria hutu contra a minoria tutsi em Ruanda, em 1994, que matou mais de 800 mil pessoas, a maioria com machetes e facões. É um dos livros mais arrasadores que já li.