“In Utero”: o “suicídio comercial” do Nirvana faz 20 anos
26/08/13 07:05Mês que vem, “In Utero”, terceiro e último disco do Nirvana, completa 20 anos.
Será lançada uma edição especial, com o álbum original, lados B e faixas-bônus remasterizados pelo produtor Steve Albini, as mixagens originais de Albini para “Heart-Shaped Box” e “All Apologies”, e a demo de “Scentless Apprentice” gravada no Rio de Janeiro.
Para um disco que deveria ser o “testamento anticomercial” do Nirvana, até que “in Utero” continua rendendo uma boa grana.
Quando saiu, em setembro de 1993, foi visto como uma reação do Nirvana ao comercialismo de “Nevermind”. Alguns falaram em “suicídio comercial”.
O próprio Kurt Cobain disse que não havia ficado feliz com o som “limpo” de “Nevermind” e que gostaria de fazer um trabalho menos pop.
Para obter um som mais agressivo e pesado, chamou a bordo o produtor Steve Albini, um herói do underground, líder do grupo Big Black e produtor de Pixies, Jesus Lizard e Didjits.
Diferentemente de “Nevermind”, cujas letras pareciam ser mais genéricas e falar do “teen spirit” da época, Cobain mirou num alvo que conhecia bem: ele próprio. Algum disco já abriu com uma frase tão autodepreciativa quanto “Teenage angst has paid off well / Now I’m bored and old” (“A raiva adolescente pagou bem / Agora estou velho e cansado”?
Cobain era um artista tão talentoso quanto inseguro. Tinha um medo enorme de ser tachado de popstar por seus amigos e fazia de tudo para manter a “credibilidade indie” do Nirvana, mesmo que “Nevermind” tivesse vendido mais que Michael Jackson.
Havia, na época, um ressentimento muito grande por parte da cena alternativa mais radical com a apropriação da música independente pelas grandes gravadoras. Com o sucesso de “Nevermind”, as corporações começaram a comprar pequenos selos a rodo, num fenômeno muito parecido com o que aconteceria, poucos anos depois, com a “bolha” da Internet.
Muita gente ganhou dinheiro, mas, quando o hype do rock alternativo esfriou, as grandes gravadoras simplesmente jogaram fora quem não havia vendido discos suficientes, e toda uma estrutura de pequenos selos, distribuidoras e bandas evaporou. Alguns, como o próprio Albini, já previam e alertavam que isso aconteceria.
Cobain se sentia culpado e fez de tudo para manter seu status de “alternativo”. Foi por isso que chamou Albini para produzir “in Utero”.
No fim das contas, a história não terminou bem. Banda e gravadora julgaram as versões de Albini abrasivas demais, e chamaram Scott Litt, que trabalhava com o REM, para remixar algumas faixas, incluindo o single “Heart-Shaped Box”.
Mesmo não vendendo tanto quanto “Nevermind”, “In Utero” foi um sucesso comercial.
A edição de setembro da revista inglesa “Mojo” traz uma reportagem especial sobre os 20 anos do disco. Há uma ótima entrevista de Cobain com Jon Savage, autor de “England’s Dreaming”, livro clássico sobre a cena punk inglesa, além de entrevistas recentes de Krist Novoselic e Dave Grohl.
Grohl conta que, antes de chamar Pat Smear (Germs) como segundo guitarrista, a banda pensou em Steve Turner e Buzz Osbourne, mas desistiu porque não queria acabar com o Mudhoney ou o Melvins. Grohl contou também que “In Utero” foi muito impactado pela descoberta, por Cobain, da música do Pavement: “As demos que gravamos no Rio provam isso”.
No trecho mais emocionante da entrevista, o baterista conta que mostrou a demo de “Scentless Apprentice” para Ian MacKaye (Fugazi, Minor Threat) e que Ian o alertou para a depressão que via nas letras, especialmente no verso “You can’t fire me, ‘cos I quit” (“Você não pode me despedir, porque eu desisti”): “Dave, isso é fodido”, disse Ian. “Eu não havia pensado nisso até então”, conta Grohl. “Quando comecei a ler as letras é que percebi que elas vinham de um lugar muito escuro.”
Sete meses depois do lançamento do disco, Cobain se matou.