Se a vida começasse agora e o Rock in Rio 2013 fosse meu primeiro show, eu não iria mais querer saber de música pelo resto da vida.
Poucas vezes tive tanta vontade de ir embora tão rápido de um lugar. Música ruim, line-up parado no tempo e um público mais interessado em ganhar brindes e pular de tirolesa. Já viu aquele filme “Westworld – Onde Ninguém Tem Alma”? Lembra muito.
O Rock in Rio não é um festival de música, é um shopping center com um show no meio. O Shop in Rio. Não há um metro quadrado sem um anúncio ou uma promotora de sorriso falso distribuindo brindes de patrocinadores. Nunca vi um blitzkrieg corporativo desses.
Segundo a organização, o custo do evento foi de 135 milhões de reais. Desses, 8,8 milhões são verba pública, captada via Lei Rouanet. Os organizadores dizem que têm todo o direito de arrecadar pela Lei, e têm razão. Mas nem tudo que é legal é ético, e não dá nem para começar a discutir como é indecente dar dinheiro público para um evento desse tamanho.
E o público, que pagou um preço alto pelo ingresso, acha super legal tirar foto na frente de um anúncio de chiclete. Na sexta, o tempo de espera para pular de tirolesa chegou a SEIS HORAS. Vi gente implorando por um balão com logotipo de um carro. Havia um stand de uma marca de cosméticos onde você podia ganhar um novo penteado – desde que aceitasse um dos “estilos” impostos pela empresa.
O parque de diversões da Cidade do Rock tinha uma parede de escalada patrocinada por uma estatal, uma tirolesa paga por uma marca de cerveja e uma roda gigante com logotipo de um banco. E não dá para esquecer a “Rock Street”, uma cidade cenográfica típica de parques de diversão de Orlando, com casas de fachada falsa, cada uma de um patrocinador. Parecia um Hard Rock Café gigante.
Ninguém está pedindo para o Rock in Rio virar um festival alternativo. Claro que Roberto Medina não vai trazer o Godspeed You! Black Emperor ou montar um palco de bandas indies da Islândia.
Mas com headliners que já garantem 85 mil pessoas por noite, não seria possível ousar um pouco, pelo menos nos palcos secundários? É só comparar o line-up do RiR com outros festivais gigantes, como Coachella e Roskilde, para sentir a diferença de qualidade, especialmente nos palcos menores.
O Coachella, realizado durante três dias de abril, também vendeu 85 mil ingressos por dia, mas com um line-up muito mais ousado. As atrações principais foram Stone Roses, Blur, Phoenix e Red Hot Chili Peppers, além de nomes como New Order, Nick Cave, The XX, Sigur Rós, Jurassic 5, Dead Can Dance e Hot Chip.
Leia aqui minha crítica do Nickelback; aqui sobre o show de Bruce Springsteen, e aqui, um texto sobre a overdose de homenagens a artistas mortos nesse Rock in Rio.
Será que o Rock in Rio deixaria de vender um mísero ingresso se Sebastian Bach fosse substituído por Nick Cave? Ou se o Wilco tocasse no lugar de Phillip Philips? Claro que não. Os ingressos esgotaram antes do anúncio do line-up completo.
Também é óbvio que boa parte do público gostou do festival. Fã é fã. Vai dizer para um adorador do Metallica ou da Beyoncé que os shows foram iguais aos de dois anos atrás?
Falando em Metallica, vi uma cena que valeu o festival: pai e filha pequena, lado a lado, tocando “air guitar” e cantando todas as músicas. Bonito demais. Só espero que a menina tenha oportunidade de ver outros festivais menos caretas e previsíveis. Crescer com o Rock in Rio 2013 de modelo não dá.
OS SHOWS
Estive no Rock in Rio nos quatro últimos dias. Aqui vão, resumidamente, as impressões sobre os shows que vi.
Rob Zombie – Sangue, trash e terror. Divertido demais. E com John 5 na guitarra!
Metallica – De banda inovadora ao Nickelback do thrash. Sad but true.
Ben Harper e Charlie Musselwhite – Emocionante ver o lendário gaitista tocando tão bem.
Matchbox Twenty – Me lembrei do festival de bandas do colégio Bennett, em 1983.
Nickelback – Tudo culpa do Aerosmith.
Bon Jovi – Vi do melhor lugar possível: de dentro do táxi.
Ivo Meirelles – Protestou contra o país. E o país protestou contra Ivo Meirelles.
Pepeu Gomes e Moraes Moreira – Pepeu tocando com os irmãos foi um absurdo. Pena que a voz de Moraes não deu as caras.
Skank – Pop de FM de qualidade. Se não acredita, compare com o Jota Quest.
Phillip Phillips – De novo, lembrei o festival de bandas do colégio Bennett, em 1983.
John Mayer – Cada geração tem o James Taylor que merece.
Bruce Springsteen – Olê, olê, olê, olê… Brucê… Brucê…
Helloween – Melhor interação de cantor com platéia: “Esse lado canta o refrão. E vocês – apontando pro outro lado – calem a porra de suas bocas!” Metal rules.
Kiara Rocks – Não sei quem agencia essa coisa, mas deixo meus parabéns. Botou uma banda de sarau de colégio no palco principal do “maior festival do mundo”.
Slayer – Gary Holt mandou bem, mas Slayer sem Dave Lombardo não é Slayer.
Avenged Sevenfold – Misfits na Broadway.
Iron Maiden – “Scream for me, Brazil! Again! And again! Annd again…” A melhor definição foi de meu amigo Bernardo Araújo, do “Globo”: Eddie é uma espécie de boneco de Olinda em versão Belzebu”.